Bolsa de valores. Ações. O ciclo das operações a termo e a tributação

I – Termo: Conceito

1. Termo de Ações é um contrato derivativo, referenciado em certa quantidade de ações (ativos objetos) para liquidação financeira a preço certo, em data futura, negociado em ambiente próprio denominado Mercado a Termo que exige controles, registros e movimentos físicos e financeiros em apartado do Mercado a Vista. Os negócios a termo se realizam, sempre, com a intermediação de uma instituição autorizada do mercado de capitais (Corretoras, no papel de Agentes de Compensação), tendo por contraparte central a Companhia Brasileira de Liquidação Custódia – a CBLC, que assume a responsabilidade pela liquidação física e financeira do contrato. Quem vende a termo, denomina-se Investidor Vendedor e quem compra a termo denomina-se Investidor Comprador. Contratado o negócio o Investidor Comprador torna-se titular do Termo e, como tal, pode ele comprar em definitivo os ativos objetos, para inclusão em sua carteira, ou, liquidar o contrato por diferença (vender os ativos objetos no mercado à vista com a finalidade pré- estabelecida de pagar o termo na forma como foi ajustada no início do negócio). Sob o ponto de vista jurídico, pode-se ter a seguinte visão esquemática:

O INVESTIDOR COMPRADOR REGISTRA O PLEITO A CORRETORA ACEITA O PLEITO E CHAMA O VENDEDOR A CBLC CONFERE A DESIGNAÇÃO E A COBERTURA DO TERMO (GARANTIA) E PROCEDE AOS REGISTROS NAS CONTAS DO VENDEDOR E DO COMPRADOR NO PAPEL DE CONTRAPARTE CENTRAL.
O INVESTIDOR VENDEDOR ACATA A CHAMADA E ORDENA A OPERAÇÃO A CORRETORA ACEITA A ORDEM E DESIGNA A OPERAÇÃO

 

2. No segmento de ações negociadas em Bolsa de Valores, o investidor interessado em fazer um Termo, será representado pelo seu Agente de Compensação (Corretora). Este representante, na função de intermediação, tomará todas as providências para que as características da operação pretendida sejam especificadas perante a Companhia Brasileira de Liquidação e Custódia. Consumada a operação o Vendedor passa a ser credor de certa importância financeira perante a contraparte central visto que a operação a termo é irretratável, isto é, os ativos objetos não mais retornarão à carteira do Vendedor. O comprador devedor, por sua vez, tem assegurada a transferência definitiva da propriedade dos ativos objetos a partir do terceiro dia útil da contratação do negócio (entre D+0 e D+3 a CBLC aguarda a cobertura ou a garantia da operação a ser prestada pelo Investidor Vendedor para concordar com a operação).

3. Os vencimentos dos contratos a termo são determinados pelo Investidor Comprador. Os prazos mais comuns são de 30 dias, 60 dias e 90 dias. Quanto à formação do preço dos contratos, destacam-se três variáveis importantes, a saber: preço do ativo objeto no mercado a vista em D+0 (data do Termo) + juros de mercado (CDI) + spread próprio deste mercado. Hoje a taxa inteira estaria ao redor de 0,70% a.m.

II – Formas de liquidação a disposição do titular do termo

4. O Titular do Termo pode liquidar sua obrigação das seguintes formas alternativas:

a) transcurso do prazo;

b) antecipação de pagamento;

c) liquidação por diferença.

5. Dá-se a liquidação financeira por transcurso de prazo quando o Investidor Comprador ordena à sua Corretora que efetue o débito do valor financeiro do Termo em sua conta corrente, promovendo a compra definitiva dos ativos objetos a serem agregados a sua carteira em custódia. Esta forma de liquidação deve ocorrer até o prazo máximo do terceiro dia anterior ao vencimento do contrato, tendo em vista que na data do vencimento do contrato os recursos financeiros deverão estar em mãos do Investidor Vendedor.

6. A liquidação por antecipação ocorre quando o Investidor Comprador resolve antecipar a compra dos ativos objetos fechando o Termo. Para tanto ele ordena e autoriza o débito em sua conta corrente do valor contratado por inteiro, ou seja, não há possibilidade de se pleitear desconto financeiro a titulo de transcurso de juros pelo sistema “pro rata tempore”. Fechado o termo os ativos objetos passam a integrar a carteira de ativos do comprador pelo preço que foi estabelecido no Termo independentemente do preço corrente, do ativo objeto, no mercado à vista.

7. A liquidação por diferença é o método que mais se ajusta aos propósitos do Investidor Comprador. Neste método, os ativos objetos são alienados no mercado à vista, pelo preço corrente de pregão, sendo que o produto desta alienação é utilizado, de plano, para fechar o Termo. Havendo valor excedente será ele o ganho na operação para o Investidor Comprador. Neste caso, tem-se que o Investidor Comprador auferiu um ganho no Mercado a Termo que será controlado em separado de outros ganhos auferidos no Mercado a Vista ou no Mercado de Opções. Em outras palavras, apura-se um ganho decorrente da negociação do contrato derivativo e não de seus ativos objetos.

III – Tributação. Renda fixa e renda variável.

8. Sujeita-se à tributação, como renda fixa, o rendimento produzido pela diferença positiva entre o valor da alienação do titulo representativo da operação (resgate, cessão, repactuação e outras formas de alienação) e o valor da aplicação financeira (capital aplicado). Incluem-se neste regime de tributação as operações conjugadas realizadas nas bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas, bem como no mercado de balcão. Operações conjugadas são aquelas que permitam a obtenção de rendimentos predeterminados (Lei nº 8.981 de 1.995 art. 65, 4º letra “a”). Vê-se assim que para efeitos tributários prevalece a natureza do rendimento em detrimento do recinto ou do mercado de realização dos contratos. Por sua vez o núcleo da incidência está materialmente vinculado ao fato de se predeterminar o rendimento a ser auferido pelo INVESTIDOR, no ato da contratação do negócio.

9. Quanto às operações conjugadas afirma-se que foi o Poder Executivo autorizado – Lei nº 8.981 de 1.995, art. 65 §6º – a baixar normas complementares para definir as características das operações conjugadas. Tais normas complementares vieram então a ser repetidas e aperfeiçoadas quando da edição da IN RFB nº 1.022 de 2.010, recentemente publicada, quando já constavam da IN SRF nº 25 de 2.001. Transcreve-se o que de perto nos interessa da IN RFB nº 1022 de 2.010 quanto ao Mercado a Termo:

“Art. 38. São também tributados como aplicações financeiras de renda fixa os rendimentos auferidos:
I – nas operações conjugadas que permitam a obtenção de rendimentos predeterminados, tais como as realizadas:
b) no mercado a termo ((…)), em operações de venda coberta e sem ajustes diários;”

10. Entre outras operações que permitem a obtenção de rendimentos predeterminados está literalmente citada, na norma complementar, a VENDA COBERTA no Mercado a Termo realizada em Bolsa de Valores, de Mercadorias, de Futuros e assemelhadas. Esta condição, de ser possível se predeterminar o rendimento, é fundamental para a definição do regime tributário a ser aplicado ao rendimento auferido pelo aplicador. Por isso mesmo nem toda VENDA COBERTA resultará em renda fixa como sugere a leitura do texto legal em apartado de outras normas escritas formadoras do feixe jurídico que disciplina a matéria.

11. Têm-se na espécie que o Poder Executivo, por intermédio da autoridade competente, usou a expressão “VENDA COBERTA” sem conceituá-la para fins próprios da tributação que indica. Em outras palavras a autoridade administrativa se valeu do jargão usado pelos operadores do mercado de capitais para designar uma operação de venda a termo, em que os ativos objetos vendidos são de pronto entregues pelo vendedor para garantir a liquidação física (entrega) da venda futura.

12. Queremos crer, no entanto, que a técnica de redação não foi feliz. Não foi feliz porque no mundo real das coisas podemos ter a ocorrência de VENDA A TERMO DE AÇÕES, coberta por formas distintas de atuação do Investidor Vendedor. Quando o Investidor Vendedor decide fazer uma Venda de Ações a Termo ele se obriga a entregar os ativos objetos e deste fato surgem duas situações distintas:

a) o vendedor não possuí os ativos objetos e para realizar o contrato ele promove no mercado a vista uma “Compra Vinculada”;

b) o vendedor já possuí em sua carteira, a quantidade física suficiente dos ativos objetos a serem entregues como cobertura da venda a termo.

13. Quando o Investidor Vendedor vai ao Mercado a Vista para efetuar uma “Compra Vinculada”, seu Agente de Compensação, já indica à CBLC que estes ativos objetos comprados formarão a cobertura do Termo assumido. Assim ele conjuga uma operação de compra a vista com uma operação de venda a prazo, onde o capital aplicado corresponde à compra à vista e o valor do Termo corresponde ao valor da liquidação financeira futura da operação. Esta modalidade de operação também é conhecida por Termo Financeiro, tendo em vista que os financiadores deste tipo de negócio, geralmente, são instituições financeiras. Presentes todas as características de uma operação conjugada têm-se por conseqüência a tributação do rendimento auferido pelo Investidor Vendedor como sendo de renda fixa.

14. A segunda situação de VENDA COBERTA ocorrerá quando o Investidor Vendedor já for proprietário da quantidade física dos ativos objetos suficiente para cobrir o Termo assumido. Neste caso não é possível se conhecer de antemão qual será o rendimento (ganho líquido) a ser auferido pelo Investidor Vendedor. O ganho do investidor somente será apurado na liquidação do Termo e dependerá de uma apuração especial do custo dos ativos objetos. Esta apuração especial será levada a efeito somente na data da liquidação do Termo tendo por base o custo médio ponderado dos ativos objetos vendidos. Pois bem, este custo médio ponderado dos ativos objetos pode ser alterado sensivelmente entre a data da contratação do Termo e a data de sua liquidação. Por isso mesmo eventual ganho auferido pelo Vendedor Coberto será considerado ganho em renda variável e não renda fixa.

Todos nossos dizeres estão fundamentados no caput do art. 51, e em seu inciso III, da IN RFB nº 1022/2010, verbis:

Mercados a Termo
Art. 51. Nos mercados a termo, o ganho líquido será constituído:
I – “omitido”
II – “omitido”
III – no caso de vendedor coberto, pela diferença positiva entre o preço estabelecido no contrato a termo e o custo médio de aquisição do ativo apurado na forma do art. 47, exceto na hipótese de operação conjugada a que se refere a alínea “b” do inciso I do caput do art. 38.

15. O Leitor deve estar atento para o fato de que o Vendedor Coberto pode auferir GANHO LÍQUIDO EM RENDA VARIÁVEL quando a operação realizada exigir que se proceda à comparação do valor do Termo com o custo médio dos ativos objetos vendidos. A introdução do inciso III do art. 51 da IN RFB 1022 de 2010 significou o aperfeiçoamento da regulamentação da matéria constante do artigo 29 da IN SRF nº 25 de 2.001. Neste ato normativo anterior, fazia-se a indicação de Renda Variável para o Investidor Vendedor somente em caso de Venda a Descoberto, sugerindo por outro lado que toda Venda Coberta geraria um rendimento de natureza da Renda Fixa, o que nunca foi verdade.

Feitas estas considerações cabe ainda advertir o Leitor para o que consta da pergunta 657 do “Perguntas e Respostas” editado pela Receita Federal do Brasil. Lá consta o que se transcreve:

GANHO LÍQUIDO – MERCADO A TERMO
657 – O que se considera ganho líquido no mercado a termo?
1 – Situação do comprador
O custo de aquisição é o preço do ativo estabelecido no contrato de compra a termo. O ganho líquido é a diferença positiva entre o valor de venda à vista do ativo, na data da liquidação do contrato a termo ou posteriormente, e o custo de aquisição.
Exemplo: O investidor comprou a termo 1.000 ações K, ao preço de R$ 10,00 por ação, totalizando o valor do contrato em R$ 10.000,00, com vencimento para 30 dias. No vencimento, o investidor vendeu no mercado à vista as 1.000 ações K por R$ 12.000,00. Assim, sem considerar a corretagem e outras despesas, temos:
Valor de venda à vista do ativo R$ 12.000,00/Custo de aquisição do ativo (R$ 10.000,00)/Ganho líquido R$ 2.000,00
2 – Situação do vendedor descoberto
O custo de aquisição é o preço de compra à vista do ativo objeto da liquidação do contrato a termo. O ganho líquido é a diferença positiva entre o preço do ativo recebido constante no contrato a termo e o custo de aquisição.
Exemplo:
O investidor vendeu a termo 1.000 ações K, ao preço de R$ 10,00 por ação, totalizando o valor do contrato em R$ 10.000,00, com vencimento para 30 dias.
No vencimento, tendo o mercado registrado movimento de baixa no período, o investidor comprou no mercado à vista o lote de 1.000 ações K por R$ 9.500,00, para honrar a liquidação do contrato a termo. Assim, sem considerar a corretagem e outras despesas, temos:
Valor contratual recebido R$ 10.000,00/Custo de aquisição do ativo (R$ 9.500,00)/Ganho líquido R$ 500,00
Atenção: O ganho obtido pelo vendedor coberto nas operações de financiamento realizadas no mercado a termo com ações é tributado como aplicação de renda fixa. (Instrução Normativa SRF nº 25, de 11 de outubro de 2001, art. 29)

16. Nota-se que o Perguntão não faz menção a IN RFB nº 1.022 de 2.010 porque editado antes da publicação da referida Instrução Normativa. Nota-se também que o redator da Pergunta 657 chamou a atenção dos contribuintes para o fato de que seria tributado como renda fixa somente as operações de financiamento levada a efeito por vendedor coberto, isto é, somente aqueles casos em que o Investidor Vendedor efetua uma “Compra Vinculada” para levar a cabo uma operação a Termo, nos moldes estabelecidos nos Procedimentos Operacionais veiculados pela CBLC, que se transcreve em parte:

“2.5.1 Ciclo de Liquidação
Data de realização da Operação (D+0)
A CBLC recebe, dos Sistemas de Negociação, as informações sobre a Operação realizada, dando início ao Ciclo de Liquidação da Operação a termo. Os Participantes de Negociação devem efetuar a Especificação das Operações que intermediarem, por meio da Rede de Serviços CBLC. Caso o Participante de Negociação não especifique a Operação em D+0, a posição é automaticamente registrada em seu nome. O Participante de Negociação representante da parte vendedora a termo pode realizar uma Operação de compra no Mercado à vista para fins de cobertura da Operação a termo, a qual é denominada “compra vinculada” e obedece às regras de Liquidação aplicáveis ao Mercado à vista. “Findo o prazo para Especificação da Operação a termo, a posição é efetivamente registrada e o total de Garantias exigidas da parte compradora é calculada segundo disposições do capítulo V deste documento.”

17. Concluí-se no ponto que o intérprete tributário deve ter todo cuidado para não deduzir da leitura dos textos legais que o ganho auferido pelo vendedor coberto em operações a termo com ações deva ser tributado como renda fixa. Será renda fixa em situações especiais de financiamento costumeiramente praticada por Bancos que perpetram uma compra vinculada para viabilizar a liquidação física do Termo. Investidores pessoas físicas não assumem o papel de Investidor Vendedor nas Operações de Termo de Ações. Este papel fica reservado aos Investidores Institucionais.

18. No caso do Investidor Comprador não há maior dificuldade. Seu ganho em Renda Variável acontecerá sempre quando ele, na figura de titular do Termo, liquidar a operação por diferença, vendendo os ativos objetos no mercado à vista para usar parte dos recursos auferidos no fechamento do Termo, ficando com o excedente como ganho auferido na operação. Haverá incidência tributária somente no caso de haver diferença positiva entre a venda no mercado a vista e o valor de fechamento do Termo. Caso o valor da venda seja inferior ao do fechamento do Termo estar-se-á em situação de perda no Mercado a Termo que somente poderá ser compensada com ganhos da mesma natureza, ou seja, ganhos no Mercado a Termo.

19. De outra parte se o Investidor Comprador, resolver fechar o Termo comprando os ativos objetos para integração de sua carteira, o valor contratado no Termo será considerado custo de aquisição dos ativos independentemente do valor do ativo cotado em pregão.

20. O fechamento do Termo por diferença é a modalidade mais praticada pelas pessoas físicas que operam em Bolsa de Valores e por isso mesmo cabe a estes contribuintes o controle individuado destas em operações em Mapas apropriados em fique demonstrada, de forma individuada, a Posição Comprada a Posição Vendida e o Resultado Auferido em cada contrato. Este controle deve ser construído em apartado dos controles inerentes ao Mercado a Vista ou ao Mercado de Opções muito embora os resultados positivos sejam todos somados para se apurar a base de cálculo da renda variável em cada mês calendário. Mantendo estes controles caberá ainda ao contribuinte o preenchimento do Anexo de Renda Variável de forma segregada quando da elaboração da Declaração de Imposto de Renda das Pessoas Físicas – DIRPF.
- Publicado pela FISCOSoft em 07/06/2010

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

Incorporação horizontal

I – Introdução

1. Também conhecida como “Incorporação Linha a Linha” esta ocorrência surge ou decorre de procedimentos contábeis empregados por ocasião dos atos societários perpetrados sob os ditames jurídicos comerciais do instituto da Incorporação de Empresas, quando praticados dentro de um mesmo conglomerado econômico financeiro. Fundamentalmente consiste em majoração de saldos credores de certas contas do Patrimônio Líquido da sociedade Incorporadora, mediante a agregação do saldo proveniente da contabilidade da sociedade Incorporada. Dito de outra forma: a contrapartida do acervo líquido incorporado não é registrada integralmente na conta de Capital Social e sim distribuída por várias contas do Patrimônio Líquido, pela via de apropriação de saldos contábeis rubrica a rubrica.

2. Há quem diga que tal procedimento contábil não afronta qualquer norma legal tributária e se consubstancia em verdadeiro planejamento tributário, visto que, resulta em vantagens fiscais comparativas em relação ao procedimento comercial geralmente levado a efeito nestas situações de incorporação de acervo líquido. No cerne da questão está a ampliação contábil das bases de cálculos dos proventos inerentes às participações societárias: Dividendos e Juros Sobre o Capital Próprio.

II – Do expurgo dos efeitos inflacionários

3. Nos últimos cinqüenta anos a União Federal, na figura de Poder Tributante, vem admitindo a redução da base de cálculo do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas em razão do reconhecimento dos efeitos inflacionários incidentes sobre a formação do lucro líquido das sociedades empresariais. Por questão de direito e de justiça, a lei sempre buscou expurgar, do lucro contábil, a perda do poder aquisitivo da moeda para não tributar mero acréscimo nominal do patrimônio.

4. Por ora recordemos as três técnicas jurídicas vigentes nas últimas décadas com a finalidade antes apontada:

ORDEM DENOMINAÇÃO
a Manutenção de Capital de Giro Próprio
b Correção Monetária de Balanço
C Juros Sobre o Capital Próprio

 

5. Todos estes mecanismos foram introduzidos no ordenamento tributário por normas técnicas, as quais, embora redigidas de forma individuada, buscavam um resultado quantitativo uno. Somente a interpretação e aplicação harmônicas destas regras poderiam e podem respaldar legalmente o efeito desejado. O bem jurídico tutelado é o valor da perda do poder aquisitivo da moeda apurado segundo a disciplina imposta pelo legislador ordinário. Destarte quem pretende buscar esta permissão legal, há de seguir estritamente o estabelecido em Lei, eis que, estamos falando de uma espécie de técnica tributária isonômica que não permite que os iguais sejam contemplados com desigualdade.

6. Por isso mesmo, a boa hermenêutica aponta para a interpretação teleológica destas regras, ou seja, revela-se de suma importância a finalidade do sistema normativo na definição da legalidade ou da ilegalidade da conduta de cada contribuinte. Não há espaço jurídico para se afirmar a legalidade, ou ilegalidade, de certo ato específico, dentre outros necessários à apuração do resultado uno. Legal ou ilegal é o resultado e não cada procedimento de per si.

7. De outro lado, todos nós sabemos que os resultados das técnicas citadas não são idênticos. As técnicas variam na forma e na fórmula de determinação do valor do bem tutelado. Recordemos as diferenças fundamentais:

ORDEM DENOMINAÇÃO
a Manutenção de Capital de Giro Próprio: Apurava-se o Capital Circulante Liquido, fazia-se certos ajustes extra contábeis, previstos em Lei, e, sobre o resultado ajustado aplicava-se certo índice inflacionário percentual. Determinado matematicamente o valor, o mesmo era levado a débito de resultado e creditado diretamente no Patrimônio Líquido da entidade empresarial.
b Correção Monetária de Balanço: Os saldos das contas do Ativo Permanente e do PL eram atualizados por índice inflacionário único, sendo as contrapartidas dos ajustes levadas a uma conta única e especifica do resultado das entidades empresariais.
C Juros Sobre o Capital Próprio: indicada certa taxa de juros – TJLP- ela é aplicada sobre a soma algébrica de saldos de determinadas contas do PL, excluído o saldo da conta Capital. Apurado matematicamente o valor é levado a débito de conta especial de resultado e creditado de forma individuada ou coletiva aos sócios ou acionistas da entidade empresarial. Assim quanto maior forem os saldos destas contas, maior será o valor do JSCP.

 

8. Hoje vigora a técnica tributária dos JSCP, mas, para todos os efeitos tributários, prevalece a rigidez da interpretação normativa.

III – Da incorporação linha a linha

9. Visualizemos o fenômeno da Incorporação Linha a Linha na seguinte representação numérica:

ACERVO LÍQUIDO DA INCORPORADA – VALORES CONTÁBEIS $
(+) ATIVO TOTAL 250.000.000,00
(-) PASSIVO TOTAL 50.000.000,00
(=) PATRIMONIO LÍQUIDO 200.000.000,00
DECOMPOSIÇÃO DO ACERVO LIQUID.
CAPITAL SOCIAL 20.000.000,00
LUCROS ACUMULADOS 180.000.000,00

 

 

ACERVO LÍQUIDO DA INCORPORADORA – VALORES CONT. $
(+) ATIVO TOTAL 20.000.000,00
(-) PASSIVO TOTAL 21.000.000,00
(=) PATRIMONIO LÍQUIDO (1.000.000,00)
DECOMPOSIÇÃO DO ACERVO LIQUID.
CAPITAL SOCIAL 5.000.000,00
PREJUÍZOS ACUMULADOS (6.000.000,00)

 

 

INCORPORAÇÃO: PROCEDIMENTO ORTODOXO
(+) ATIVO TOTAL 270.000.000,00
(-) PASSIVO TOTAL 71.000.000,00
(=) ACERVO LÍQUIDO 199.000.000,00
DECOMPOSIÇÃO DO ACERVO LIQUID.
CAPITAL SOCIAL 205.000.000,00
PREJUÍZOS ACUMULADOS (6.000.000,00)

 

 

INCORPORAÇÃO LINHA A LINHA
(+) ATIVO TOTAL 270.000.000,00
(-) PASSIVO TOTAL 71.000.000,00
(=) ACERVO LÍQUIDO 199.000.000,00
DECOMPOSIÇÃO DO ACERVO LIQUID.
CAPITAL SOCIAL 25.000.000,00
LUCROS ACUMULADOS 174.000.000,00

 

 

TABELA COMPARATIVA ENTRE OS PROCEDIMENTOS CONTABEIS
CONTAS PL ORTODOXO LINHA A LINHA DIFERENÇA
CAPITAL SOCIAL 205.000.000,00 25.000.000,00 180.000.000,00
RES. ACUMULADOS (-6.000.000,00) 174.000.000,00 (-180.000.000,00)
TOTAL DO PL 199.000.000,00 199.000.000,00 ZERO

 

10. É notório que a Incorporação Linha a Linha provocou significa alteração na conta de Prejuízos Acumulados da Incorporadora, transformando o que antes era Prejuízos Acumulados em Lucros Acumulados. Esta metamorfose contábil não pode e não deve influir na apuração jurídica tributária da base de cálculo dos Juros Sobre o Capital Próprio ou mesmo sobre a quantificação dos Dividendos a Distribuir porque os dois institutos são tutelados por normas especiais de tributação.

IV- Do direito privado

11. Do regime jurídico das incorporações de empresas – Lei 6.404/76, arts. 227, 230, 231, 232,234,264- extrai-se o seguinte texto constante do §1º do art. 227:

“A assembléia geral da companhia incorporadora, se aprovar o protocolo da operação, deverá autorizar o aumento de capital a ser subscrito e realizado pela incorporadora mediante a versão de seu patrimônio liquido, e nomear os peritos que o avaliarão”

12. Infere-se do texto normativo que a Incorporação de Empresa pressupõe aumento de capital social de certa sociedade, denominada Incorporadora, mediante entrega, do total da riqueza patrimonial devidamente avaliada, por outra sociedade, denominada incorporada. Não é nenhuma heresia afirmar-se que a Incorporação de Empresa é uma modalidade especial de aumento de capital social em bens, de sociedades empresariais, visto que consumadas a subscrição e a integralização do capital social da Incorporadora, os acionistas da Incorporada passam a ser acionistas da Incorporadora, sem alteração da riqueza jurídica patrimonial de cada acionista. Por isso mesmo é que se costuma tratar a Incorporação de Empresas como mera reorganização societária.

13. Sem mais delongas neste ponto, tem-se que o acervo líquido vertido da incorporada para incorporadora deve sensibilizar a conta de Capital Social da Incorporadora e nunca as demais contas do Patrimônio Líquido desta. O assunto nem é novo. A Receita Federal do Brasil, ainda quando se denominava Secretaria da Receita Federal, através de seu Órgão Central, então denominado Coordenação do Sistema de Tributação, expediu o Parecer Normativo CST nº 462 de 1.971 onde assentava frente ao Direito Comercial da época, os pontos que ora reproduzimos na tabela que segue:

PN CST 462/71 – PN – Parecer Normativo COORDENADOR DO SISTEMA DE TRIBUTAÇÃO – CST nº 462 de 07.07.1971 / D.O.U. 18.08.1971
EMENTA – Incabível a incorporação de empresas tomando-se por base outros valores que não o do patrimônio líquido da incorporada. Tributa-se, como distribuição disfarçada de lucros, a parte do excedente que, sob qualquer forma, couber aos acionistas, sócios ou titulares da empresa extinta sendo, ainda, vedada a compensação de seus prejuízos pela remanescente.
1. Empresa de responsabilidade limitada, pretendendo incorporar outra empresa, esta sociedade anônima, mediante simples apropriação dos saldos das contas constantes do balanço de encerramento da incorporada, inclusive prejuízos, informando antes que ambas possuem como participante maioritária em seus capitais uma mesma empresa estrangeira indaga se correto o seu entendimento de que: não haverá qualquer tributação para os acionistas da incorporada ao receberem um número de quotas igual ao número de ações e de valor também igual; não haverá qualquer tributo para a pessoa jurídica, uma vez que não haverá qualquer alteração nos valores contábeis de qualquer das contas, que simplesmente passarão de uma para outra empresa; poderá utilizar o prejuízo fiscal apurado na declaração de renda anterior da incorporada para compensação contra o lucro real da incorporadora.
2. O expediente das incorporações de empresa tem suas implicações fiscais na órbita do imposto de renda, contempladas nos arts. 222 e 223 do vigente Regulamento do Imposto de Renda (Decreto nº 58.400/66). Prevê o mencionado art. 222. :
Ressalvado o disposto no art. 194. , o imposto continuará a ser pago como se não houvesse alteração nas firmas ou sociedades nos casos de:
a) sucessão na forma da legislação em vigor; b) … c) …
3. Como se observa, para que seja invocada a aplicação da norma contida no retrocitado art. 222. , é requisito imprescindível que a sucessão se dê segundo as prescrições da legislação pertinente. Reporta-se, portanto, a lei fiscal à legislação comercial, a cuja observância condiciona a sua aplicabilidade. (grifamos)
4. Na legislação comercial ocupa-se da matéria o art. 152. e seus parágrafos do Decreto-Lei nº 2.627, de 26/09/40, aplicáveis tanto às sociedades anônimas – por serem seu objeto específico – como às sociedades de responsabilidade limitada, face ao que dispõe o art. 18. do Decreto nº 3.708, de 10/01/19.
5. Preceituam os supramencionados dispositivos legais:
“Art. 152. – A incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que Ihes sucede em todos os direitos e obrigações.
§ 1º A sociedade anônima incorporadora deverá, em assembléia geral, na forma desta lei, aprovar as bases da operação e o projeto de reforma dos estatutos. As sociedades que houverem de ser absorvidas tomarão conhecimento destes atos e, se os aprovarem, autorizarão os administradores a praticar todos os atos necessários a incorporação, inclusive a subscrição em bens pelo valor que se verificar entre o ativo e o passivo. (grifamos)
§ 2º A assembléia geral da sociedade anônima incorporadora nomeará os peritos para avaliação do patrimônio líquido das sociedades que tenham que ser incorporadas, e, aprovado o laudo da avaliação, promoverão os diretores daquela sociedade o arquivamento e a publicação dos respectivos atos.
§ 3º Os sócios ou acionistas das sociedades incorporadas, aprovado o laudo da avaliação pela assembléia geral da sociedade anônima incorporadora, deverão reunir-se e declarar extintas as sociedades incorporadas, arquivando-se e publicando-se em seguida os respectivos atos, juntamente com os referidos no parágrafo anterior
6. Sem maiores esforços de interpretação, da leitura dos textos legais salta à vista de pronto uma formalidade essencial à realidade do ato jurídico: se efetue a incorporação tendo por base o patrimônio líquido da incorporada, avaliável, inclusive por peritos nomeados. Em última análise, impõe-se à operação a obediência às mesmas formalidades exigíveis na subscrição de capital mediante ingresso de bens. (grifamos)
7. Não obstante a clareza de tais preceitos, positivamente, não os atenderia o procedimento pretendido pela consulente. Isto porque, ao se proceder à incorporação pelo valor do capital nominal da incorporada, sem a devida consideração à existência de prejuízos acumulados, na realidade estar-se-ia atribuindo valor positivo, como patrimonial, a uma parcela de valor negativo, representativa justamente de real decréscimo do patrimônio da empresa. Seria, em síntese, uma subscrição de capital sem correspondência de qualquer ingresso, o que representaria não só uma aberração do ponto de vista econômico, como um atentado nos mandamentos legais de regência (arts. 4º e 152 do Decreto-Lei nº 2.627/40 e 287 do Código Comercial Brasileiro).
8. Por conseguinte, incabível tal procedimento segundo os cânones da legislação comercial, para efeitos fiscais, também não poderá prosperar sob amparo do dispositivo invocado (art. 22. do Regulamento do Imposto de Renda). Bem ao contrário, submeter-se-á a pretensa incorporadora a restrições e sanções face ao que, em verdade, equivalerá à operação.

V- Conclusão

14. A Incorporação de Empresa (também denominada incorporação de acervo líquido) é um ato jurídico complexivo (dependente do encadeamento lógico de vários atos válidos) e solene ( forma especial de contratação de observação obrigatória). Portanto todas as formalidades do ato devem ser observadas, a ponto de afirmar-se que não existe incorporação de fato. Formalizada a incorporação, desaparece do universo jurídico a pessoa da incorporada, sendo que seus direitos e obrigações são transferidos por sucessão universal à incorporadora.

15. Ora esta figura da sucessão universal de direitos e obrigações não deve levar o operador do direito a equívocos. Os direitos e obrigações referidos, na sucessão, dizem respeito àquelas relações jurídicas existentes no momento da consumação da incorporação em que a pessoa jurídica da incorporada estava presente como contraparte, isto é como credora ou devedora, ou como titular de direitos aperfeiçoados. De longe não se cogita em sucessão de regime jurídico. Não há direito adquirido em matéria de regime jurídico, aliás, como já decidido pelo Supremo Tribunal Federal.

16. Subscrito e integralizado o capital social da incorporadora, na forma da Lei, será esta posta como destinatária dos regimes jurídicos que lhe aprouverem, segundo suas próprias qualificações jurídicas, econômicas, societárias e contábeis. Não mais há relevância na situação antes existente na incorporada. Destarte se a incorporada dispunha de Lucros Acumulados em seu Patrimônio Líquido e sobre este saldo pudesse calcular Juros Sobre o Capital Próprio, não significa que a Lei Comercial ou Tributária autorize o mesmo procedimento na incorporadora, caso esta incorporadora não disponha de lucros acumulados. Não nos esqueçamos que durante o processo de incorporação a figura dos “lucros acumulados”, presentes na incorporada, desaparece do mundo jurídico para ser substituída por outro conceito legal, que é o do Patrimônio Líquido Vertido (acervo líquido). Enfim, subscreve-se e integraliza-se capital social com bens e direitos, reduzidos devidamente pelas obrigações, e não com rubricas contábeis.

17. Queremos crer que não há planejamento tributário na incorporação linha a linha e sim ilegalidade tributária de conduta se houver majoração das bases de cálculo dos Juros Sobre Capital Próprio ou mesmo aumento indevido dos Dividendos a Distribuir. A forma contábil de registro de negócios societários não tem o condão de alterar a dimensão financeira de institutos jurídicos arquitetados de forma rígida e isonômica. Não se pode confundir a liberdade de contratar e contabilizar com a inobservância de normas cogentes nestas matérias.

- Publicado pela FISCOSoft em 03/05/2010

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

Disciplina tributária das perdas em créditos frente às inovações técnicas da escrituração contábil

Contabilização em padrões internancionais das contas a receber de clintes mercantis

1. Sempre que possível, os órgãos técnicos, que veiculam normas de contabilidade, vêm afirmando, com todas as letras, a primazia da substância econômica- financeira sobre a forma jurídica do negócio, para fins de escrituração contábil. Assim, consta da Norma Técnica – NBC T 19.41- aprovada pela Resolução do Conselho Federal de Contabilidade nº 1.255 de 10 de dezembro de 2.009:

“Primazia da essência sobre a forma
2.8 Transações e outros eventos e condições devem ser contabilizados e apresentados de acordo com sua essência e não meramente sob sua forma legal. Isso aumenta a confiabilidade das demonstrações contábeis.”

2. Eis então que é lançada aos comerciantes e industriais, de pequeno ou médio porte, a expressão “Instrumentos de Dívida” com a finalidade de indicar certo conjunto de elementos patrimoniais que serão escriturados e mensurados na forma estabelecida em norma técnica. A qualificação de um elemento patrimonial como “Instrumento de Dívida” não decorre, assim de um conceito ou categoria jurídica, mas, da presença de certas características financeiras do ativo ou do passivo a ser escriturado e quantificado. O item 11.9 da NBC T 19.41 especifica estas características que podem ser, assim, resumidas sob a ótica do titular do direito – titular do ativo financeiro-:

a) o credor sempre espera um retorno fixo ou positivo, se for o caso da fluência de juros, a taxa de juros fixa ou variável;

b) impossibilidade de incorrer em perdas (do principal e dos juros) por disposição contratual;

c) o contrato não estabelece direito de recebimento antecipado vinculado a ocorrência de um evento futuro, e

d) o contrato não estabelece retornos ou reembolsos condicionais.

3. Neste sentido os títulos de créditos originados de contratos de compra e venda mercantil se qualificam como “Instrumentos de Dívida” e devem ser escriturados no Ativo Circulante, como ativos financeiros, com a seguinte segregação:

CLIENTES- CONTAS A RECEBER
CLIENTES- PARTES RELACIONADAS
CLIENTES- VALORES NÃO FATURADOS

 

(*) NBC T 19.41 : 4.11 A entidade deve divulgar, no balanço patrimonial ou nas notas explicativas, obedecida a legislação vigente, as seguintes subclassificações de contas: (a..); b contas a receber e outros recebíveis, demonstrando separadamente os valores relativos a partes relacionadas, valores devidos por outras partes, e recebíveis gerados por receitas contabilizadas pela competência mas ainda não faturadas;

4. As regras de mensuração destes ativos, também, estão na mesma Norma Técnica e são enunciadas de forma classificada segundo o aspecto temporal da ocorrência do procedimento, a saber: Mensuração Inicial e Mensuração Subseqüente. A Mensuração Inicial ocorre quando da formalização jurídica do ato contratual e a Mensuração Subseqüente acontece ao final de cada exercício social.

5. Como disciplina normativa, o comando maior a versar sobre a técnica de avaliação está assentado no art. 183 da Lei nº 6.404/76 – Leis das S/A – com a redação incluída pela Lei nº 11.638 de 2.007, “verbis”:

Art. 183. No balanço, os elementos do ativo serão avaliados segundo os seguintes critérios:
I – as aplicações em instrumentos financeiros, inclusive derivativos, e em direitos e títulos de créditos, classificados no ativo circulante ou no realizável a longo prazo:
a) pelo seu valor justo, quando se tratar de aplicações destinadas à negociação ou disponíveis para venda; e
b) pelo valor de custo de aquisição ou valor de emissão, atualizado conforme disposições legais ou contratuais, ajustado ao valor provável de realização, quando este for inferior, no caso das demais aplicações e os direitos e títulos de crédito;

6. Nota-se no texto legal que o legislador ordinário incorporou, para fins contábeis, a designação “Instrumentos Financeiros” para indicar certo conjunto de direitos e obrigações passíveis de serem avaliados por técnicas oriundas do mundo da economia e das finanças. Não se trata, portanto, de uma nova categoria jurídica. Cada ato ou fato jurídico subjacente a um instrumento financeiro continua a ser regido por nosso Código Civil. A designação tem, assim, sua utilidade voltada apenas para a representação contábil dos direitos e obrigações assumidos.

7. Quanto às técnicas de avaliação, propriamente ditas, temos que a letra “a” do inciso I do art. 183 está direcionada às situações em que os ativos financeiros serão alienados ou cedidos em curto prazo de tempo. A letra “b”, por sua vez, sim tem aplicação assegurada às Duplicatas Mercantis. Desta norma técnica é possível se extrair as seguintes conclusões:

1ª- o ativo financeiro, duplicata a receber, será reconhecido pelo valor de emissão, na primeira avaliação;

2ª- o valor reconhecido será devidamente atualizado segundo as cláusulas contratuais que dispuserem sobre atualização positiva (acruado pela taxa de juros fixa ou determinável);

3ª- As duplicatas mercantis também estão sujeitas ao teste do valor recuperável (impairment test), quando for certificada a ocorrência de perda total ou parcial do valor financeiro do ativo para ser apropriada diretamente em contas de resultado.

8. Embora o texto da Lei se valha da expressão “Valor Provável de Realização” não se pode inferir que seja possível a abertura de contas de Provisão Para Créditos de Liquidação Duvidosa, para ajustar o valor contábil dos recebíveis, como se fazia no passado, com base na teoria das probabilidades. È sempre bom lembrar que cabe ao intérprete a identificação do conteúdo normativo da Lei, sem maior apego ao instrumento de linguagem que é o texto. Texto é texto, norma é norma. Por isso, o item 66 da Orientação nº 3 do Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC -, que versa sobre Instrumentos Financeiros, no ponto afirma:

“Provisões e impairment
66 O princípio que norteia o presente Pronunciamento não admite a constituição de provisões para perdas esperadas – ou seja, provisões para perdas futuras para as quais não esteja associada a eventos passados. No caso das provisões para créditos de liquidação duvidosa, por exemplo, somente deve ocorrer o reconhecimento de provisão para perdas por impairment (perda do valor recuperável dos ativos) quando houver evidências de que o montante do crédito não mais será recebido, no todo ou em parte (provisões de perdas incorridas).
Um ativo financeiro ou um grupo de ativos financeiros tem perda no valor recuperável e incorre-se em perda no valor recuperável se, e apenas se, existir evidência objetiva de perda no valor recuperável como resultado de um ou mais eventos que ocorreram após o reconhecimento inicial do ativo (evento de perda) e se esse evento de perda tiver impacto nos fluxos de caixa futuros estimados do ativo financeiro ou do grupo de ativos financeiros que possa ser confiavelmente estimado. “(grifamos)

9. Vale dizer: é preciso que a perda seja apurada sob condições objetivas envolvendo cada devedor, ou certa classe de devedores. As evidências exigidas para a formação de provisão para perdas se consumam em um verdadeiro feixe de indícios convergentes que haverão de assumir força probante, desde que documentadas. O mero registro contábil não refletirá a exigência da norma de mensuração. A técnica só comporta a valoração – material e formal- da perda incorrida. Reconhecida a perda incorrida, no modelo de conta de Provisão, o que se espera são mudanças de cenário que possam reverter a situação posta no momento do reconhecimento da perda. Assim o evento futuro e incerto é a recuperação do valor já perdido e não a ocorrência da perda.

10. Finalizando esta seção temos a assentar que as empresas, não financeiras, que adotarem este novo padrão de contabilidade, deverão contabilizar suas Duplicatas a Receber pelo valor de emissão, “acruando” os títulos, se for o caso, segundo os juros positivos previstos em contrato.

11. Excepcionalmente, as entidades poderão instaurar conta de Provisão para Perdas Incorridas, como conta redutora dos valores recebíveis, provisão esta passível de reversão.

12. Por tudo que foi dito, as empresas que adotarem o novo padrão contábil, por opção ou por obrigação, não mais poderão cumprir a sistemática de controle tributário das perdas em créditos marcadas, imposta aos contribuintes na forma constante do art. 10 da Lei nº 9.430/96 que assim dispõe:

Registro Contábil das Perdas
Art. 10. Os registros contábeis das perdas admitidas nesta Lei serão efetuados a débito de conta de resultado e a crédito:
I – da conta que registra o crédito de que trata a alínea a do inciso II do § 1º do artigo anterior;
II – de conta redutora do crédito, nas demais hipóteses.

13. Dito de outra forma: não se pode mais registrar na escrituração contábil as marcas do tratamento tributário especial dado aos títulos de créditos que tiveram origem nas operações sociais das entidades. O controle contábil destes efeitos fiscais não mais se coaduna com padrão internacional de contabilidade.

14. O presente trabalho visa enfrentar este aparente conflito de normas, posto que a Lei nº 11.638 de 2.008 e a Lei nº 11.941 de 2.009 não revogaram explicitamente estas disposições contábeis do art. 10 da Lei nº 9.430/96.

Lei Complementar nº 95 de 1.998 e o processo de elaboração de leis

15. Atualmente o processo de elaboração de leis é disciplinado por Lei Complementar – LC 95 -. Neste novo regramento do processo legislativo não se vislumbra mais a revogação tácita (derrogação), sendo positivada regra própria para as cláusulas de revogação de leis ou dispositivos de lei, nos seguintes termos:

“Art. 9o A cláusula de revogação deverá enumerar, expressamente, as leis ou disposições legais revogadas. (Redação dada pela Lei Complementar nº 107, de 26.4.2001)”

16. De outro lado não se pode conceber que a Lei nº 11.638 de 2.007, que introduz, em nosso País, este novo padrão contábil, tenha ingressado no mundo jurídico eivada de falhas e incorreções. Toda a Lei, emanada do Estado, goza de presunção de legitimidade até que não seja afastada do ordenamento pelo Supremo Tribunal Federal, por vício formal ou material. Portanto não há erro ou equívoco manifesto na Lei nº 11.638.

17. Como os incisos I e II do art. 10 da Lei nº 9.430/96 não foram, expressamente, revogados eles continuam em plena vigência.

18. Surge então o dilema para os empresários que adotarem no novo padrão contábil e fizerem uso dos permissivos de dedutibilidade previstos na disciplina tributária de Perdas em Créditos. Estarão eles obrigados a escrituração preconizada nos incisos I e II do art. 10 da Lei nº 9.430/96 ou seguirão as imposições dos órgãos responsáveis pela normatização das técnicas de contabilização?

19. O aparente conflito veio então ser devidamente equacionado no ano de 2.009, quando a nova redação legal dada, pela Lei nº 11.941, ao §2º do art. 177 da Lei nº 6.404/76 estabeleceu em bom vernáculo:

“§ 2o A companhia observará exclusivamente em livros ou registros auxiliares, sem qualquer modificação da escrituração mercantil e das demonstrações reguladas nesta Lei, as disposições da lei tributária, ou de legislação especial sobre a atividade que constitui seu objeto, que prescrevam, conduzam ou incentivem a utilização de métodos ou critérios contábeis diferentes ou determinem registros, lançamentos ou ajustes ou a elaboração de outras demonstrações financeiras.”

20. Esta modificação de ordem legal, versada no citado parágrafo, não tem como conseqüência direta a revogação tácita dos dispositivos da Lei 9.430 em comento. Aquele imperativo permanece, ou seja, o controle, no tempo, das perdas temporárias em créditos marcados permanece. Foi alterado somente o assentamento físico do controle: dos livros, Diário e Razão, para livros ou registros auxiliares. Quanto ao direito material nada a comentar, pois ele permanece inalterado.

21. Não há grande novidade nesta conclusão. Mesmo antes da edição das Leis nºs 11.638 e 11.941, as instituições financeiras e as seguradoras, já não seguiam literalmente os dispositivos insertos nos incisos I e II do art. 10 da Lei nº 9.430/96. Tais instituições seguem as regras contábeis do Banco Central do Brasil – BACEN- e da Superintendência de Seguros Privados – SUSEP- que estabelecem, por Lei, Plano de Contas Contábeis próprios.

22. O conforto do leitor passa pelo domínio do conteúdo normativo da disciplina tributária das Perdas em Créditos. E por isso, vamos lançar os fundamentos desta disciplina sem tentar enfrentar todas as questões derivadas. Vamos discorrer sobre aquilo que o leitor não pode deixar de conhecer.

Perdas em créditos. Lei nº 9.430 de 1.996 arts. 9º a 12º. interpretação sistemática. Perdas temporárias versus perdas efetivas. matéria sujeita à disciplina especial.

23. Da interpretação integrada e sistemática dos arts. 9º e 10 da Lei nº 9.430/96, pode-se concluir que a norma reduziu a realidade concreta a três tipos fenomenológicos assim reconhecidos:

PERDA EFETIVA
A perda efetiva ocorre quando o credor está munido de sentença emanada do Poder Judiciário declarando a insolvência do devedor – inciso I do §1º do art. 9º-. Esta ocorrência implica na baixa contábil do título diretamente para a conta de resultado pertinente.

Cuida-se de uma tipificação cerrada utilizada pelo legislador para evitar outras interpretações que não a literal.

PERDA TEMPORÁRIA
A perda temporária só pode ser marcada quando certas condições objetivas (valor do crédito, tempo decorrido da inadimplência, procedimentos judiciais, ou, extra-judiciais) forem atendidas pelo credor em relação a cada crédito. Marcar um crédito é tomar a dedutibilidade, total ou parcial, de um crédito, em situação provisória, ou seja, para acerto de contas no futuro. Os credores inertes não podem fazer uso da perda temporária; somente aqueles contribuintes que venham mantendo procedimentos de cobrança, a não ser que o crédito seja de valor inferior a R$5.000,00.
PERDA DEFINITIVA
A perda definitiva é uma decorrência da perda temporária; ocorre quando o crédito não é liquidado pelo devedor no prazo de cinco anos do vencimento, ainda que mantidos os procedimentos de cobrança.

 

24. Como norma especial a versar sobre dedutibilidade, estas regras da Lei nº 9.430 prevalecem sobre a norma de caráter geral – RIR/99 art. 299- que afirma que as despesas normais e usuais podem ser deduzidas das bases de caçulo do IRPJ e da CSLL. Por isso mesmo, um desconto concedido no recebimento de uma duplicata, após seu vencimento, seja pelo credor inerte, seja pelo credor que venha empreendendo procedimentos de cobrança, não será dedutível (lei nº 9.430/96, art. 10, §1º) como se infere do texto legal:

§ 1º Ocorrendo a desistência da cobrança pela via judicial, antes de decorridos cinco anos do vencimento do crédito, a perda eventualmente registrada deverá ser estornada ou adicionada ao lucro líquido, para determinação do lucro real correspondente ao período de apuração em que se der a desistência.

25. Este desconto concedido- o qual não pode e não deve ser confundido com o desconto financeiro ocorrido antes do vencimento título por antecipação de pagamento- pode ser normal e usual na atividade da entidade. Porém estes adjetivos não são suficientes para afastar a incidência da regra especial. Desistência no sentido do conteúdo normativo significa renúncia de qualquer espécie.

Proposta de controle das perdas temporárias

26. Como já vimos, o controle analítico das perdas temporárias é compulsório. Controlar, analiticamente, implica em demonstrar, à saciedade, que certo titulo de crédito foi objeto de marcação por perda temporária em certa data passada, porque todas as condições legais foram cumpridas àquela data, e, que, no momento, a situação da cobrança está ou não resolvida. Sobre outro ângulo, pode-se afirmar que cabe ao contribuinte comprovar o termo inicial e final de um ato jurídico que se completa em certo período de tempo (ato jurídico complexo e não ato jurídico instantâneo).

27. De outro lado, a imposição de controle analítico, não implica dizer que o contribuinte está obrigado a registrar formalmente todas as ocorrências – uma por uma- ignorando todos os recursos tecnológicos de gestão de banco de dados de que hoje dispomos. Nada impede que o controle analítico seja mantido em registro auxiliar, desde que os valores sintetizados sejam escriturados na forma da Lei.

28. Este controle deve ser instrumentalizado pela abertura de contas fiscais na parte “B” do Livro de Apuração do Lucro Real, conforme ficou estabelecido na Instrução Normativa SRF nº 28 de 1.978, da qual se relembra alguns pontos:

“4.2 – Forma de Escrituração
A escrituração relativa ao controle de valores que devam influenciar a determinação do lucro real de exercícios posteriores far-se-á mediante a utilização de uma folha para cada conta ou fato que requeira controle individualizado, de conformidade com a seguinte orientação:
Coluna 6 – Débito
Coluna destinada a registrar os valores que constituirão adições ao lucro líquido de exercícios futuros, para determinação do lucro real respectivo.
Coluna 7 – Crédito
Coluna destinada ao registro dos valores que constituirão exclusões nos exercícios subseqüentes. “(grifamos)

29. A titulo de exemplo de abertura de uma conta fiscal, para controle das perdas temporárias, vamos tomar a classe dos créditos de valor igual ou inferior a R$5.000,00, sem garantia de valor, que não foram liquidados após o transcurso do tempo de 6(seis) meses do o vencimento. Para esta classe de créditos a lei não exige (princípio da materialidade) instauração de procedimentos de cobrança para que se possa tomar a dedutibilidade da perda temporária.

30. De plano, deve ser estabelecida a nomenclatura da conta, sendo conveniente uma referência expressa à norma legal que rege o ponto especifico da matéria. Sugere-se, então, o seguinte nome para a conta fiscal, neste caso: LEI 9430/96, ART.9º, §1º, INCISO II, LETRA “A”- CRÉDITOS ATÉ R$5.000,00-.

31. Tomada a dedutibilidade temporária, o valor do título será excluído do Lucro Liquido na parte A do LALUR e será simetricamente levado à debito da conta fiscal aberta na parte B do mesmo livro fiscal. Em se tratando de registro analítico todas as características da duplicata serão escritas a titulo de histórico do lançamento. A motivação jurídica do registro já está implícita no próprio nome da conta movimentada.

32. Feito este primeiro registro formal, têm-se como implementado o termo inicial do ato jurídico complexo que agora dependerá da formalização de um termo final. Este termo final poderá ocorrer de três formas, a saber:

32.1 Transcorrido o prazo de cinco anos de vencimento do crédito, o mesmo não foi liquidado pelo devedor. Este fenômeno será representado juridicamente pela baixa do valor2 titulo na conta fiscal, a qual será instrumentalizada por um crédito na conta fiscal devidamente historiado pela descrição do acontecido (realça-se que este crédito prescinde de contra partida); a perda marcada deixa de ser TEMPORÁRIA para ser DEFINITIVA.

32.2 Houve recebimento parcial do valor do título com a extinção da relação jurídica entre credor e devedor; em outro sentido: houve renuncia parcial de valor a receber. Neste caso o valor recuperado, valor este sempre inferior ao que fora deduzido como perda temporária no passado, será nos termos do art. 12 da Lei adicionado ao lucro líquido para fins de apuração do lucro real, na parte A do LALUR; na conta fiscal inserta na parte B do LALUR será feito um crédito discriminando o título, seu valor original, a perda temporária marcada e seu valor recuperado. A parcela da renúncia, como fenômeno individuado, será também adicionada ao lucro líquido para determinação do lucro real (entenda-se o comando extensivo à base de cálculo da CSLL) com o correspondente crédito na conta fiscal na parte B do LALUR. Neste caso de renúncia, a Lei exige que o imposto reduzido à época da marcação da perda temporária seja devolvido com encargos moratórios, exceção feita, quanto aos encargos moratórios, às situações de renúncias acontecidas em sede de acordo homologado pelo Poder Judiciário.

32.3 Houve recebimento total do valor a receber; segue-se o mesmo procedimento indicado para o recebimento parcial.

Alerta

33. Para esta classe de créditos, até R$5.000,00, vencidos há mais de 180 dias e sem procedimentos de cobrança instaurados, há de se fazer um alerta. Segue que o registro contábil permitido no inciso I do art. 10 da Lei nº 9.430 – debitar a conta de resultado e creditar diretamente o titulo no ativo circulante- não torna esta perda como definitiva e muito menos como efetiva. Apenas foi dispensado o controle contábil individuado na escrituração comercial. O controle fiscal é compulsório porque a perda é temporária.

Conclusão

34. As mudanças efetuadas na Lei nº 6.404/76 versando sobre contabilidade e demonstrações financeiras em nada afetaram o direito material constante dos dispositivos da Lei nº 9.430/96 que versam sobre Perdas em Créditos. As empresas, não financeiras, que adotarem por opção ou compulsoriamente o novo padrão contábil, haverão de promover o controle fiscal das perdas temporárias e definitivas no Livro de Apuração do Lucro Real, seja por intermédio de registros analíticos, seja por intermédio de registros sintéticos desde que devidamente instruídos por registros auxiliares. O império do controle resta confirmado na Lei nº 9430/96 que em nada foi alterada pelas Leis nºs 11.638/2.007 e 11.941/2.009. Não se vislumbra também, na espécie, a figura da antinomia de leis.

35. Eventuais registros contábeis em conta de Provisão para Perdas Incorridas, em nada afetarão os controles tributários preconizados na Lei nº 9.430/96 e, nem os substituirão. Também não poderão sensibilizar as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

 

- Publicado pela FISCOSoft em 16/03/2010

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

Estrita legalidade na prática tributária

Introdução

1.Sacha Calmon Navarro Coelho discorrendo sobre o princípio constitucional da estrita legalidade lecionou: “… se a lei for omissa, ou obscura, ou antiética… descabe ao administrador (que aplica a lei de ofício) e ao juiz (que aplica a lei contenciosamente) integrarem a lei, suprindo a lacuna por analogia. É dizer, em Direito Tributário a tipicidade é cerrada oferecendo resistência ao princípio de que o juiz não se furta a dizer o direito ao argumento da obscuridade na lei ou de dificuldades na sua intelecção. Na área tributária o juiz deve sentenciar, é certo, mas para decretar a inaplicabilidade da lei por insuficiência normativa somente suprível através de ato formal e materialmente legislativo” (grifos do autor); (pg.405, 3ª edição, Del Rey, BH 1.999, O Controle da Constitucionalidade das Leis)

2.A instituição e a majoração de tributos compete exclusivamente ao Poder Legislativo que na figura de representante do povo expressa formalmente, e por rito próprio, o que será tributado, quando e como será tributado, e, quem suportará o ônus financeiro do encargo (CTN art. 97 e §§), nos termos da Lei.

3. A supremacia do princípio da estrita legalidade da tributação é posta pela doutrina como verdadeira manifestação do Estado Democrático de Direito, por isso o rigor da lição de Sacha Calmon. Vale dizer: não pode o Poder Executivo (salvo os casos ressalvados na Constituição), ou mesmo seus agentes, frente a uma imprecisão da Lei, impor, por ato próprio, regra que implique em tornar o tributo mais oneroso. Neste sentido está expresso, de forma cristalina, no §1º do art. 97 do CTN:

“Equipara-se à majoração do tributo, a modificação de sua base de cálculo, que importe em torná-lo mais oneroso”

3.Assim base de cálculo de tributo, em todas as suas dimensões, é matéria reservada à Lei, não havendo, em tese, controvérsias sobre este verdadeiro postulado.

4.Todavia nem sempre a quantificação da base de cálculo será extraída de um único dispositivo de Lei, exigindo do intérprete a visitação por todo o sistema normativo tributário, munido, ainda, de outros princípios constitucionais da mesma importância que o da legalidade, tais como, o da anterioridade e o da irretroatividade da Lei.

5.Neste trabalho pretendemos tangenciar alguns casos conflituosos que exigiram ou irão, ainda, exigir a intervenção dos Tribunais Superiores para confirmar ou infirmar a observância do princípio da legalidade tributária, seja por parte do Legislativo, seja por parte do Executivo. Trata-se, outrossim, do controle jurisdicional do poder de tributar inerente ao nosso sistema constitucional.

Ganho de capital das pessoas físicas na alienação de imóveis herdados

6.Sobre a matéria, duas Súmulas de números seqüenciais, já foram emitidas pelo Supremo Tribunal federal, a saber:

SÚMULA Nº 98/ SENDO O IMÓVEL ALIENADO NA VIGÊNCIA DA LEI 3470, DE 28/11/1958, AINDA QUE ADQUIRIDO POR HERANÇA, USUCAPIÃO OU A TÍTULO GRATUITO, É DEVIDO O IMPOSTO DE LUCRO IMOBILIÁRIO. SÚMULA Nº 99/ NÃO É DEVIDO O IMPOSTO DE LUCRO IMOBILIÁRIO, QUANDO A ALIENAÇÃO DE IMÓVEL ADQUIRIDO POR HERANÇA, OU A TÍTULO GRATUITO, TIVER SIDO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 3470, DE 28/11/1958.

7.A razão da expedição destas orientações superiores está centrada na redação do art. 7º e parágrafo da Lei nº 3.470 de 1.958, então vigente à época das Sumulas, que assentava:

Art. 7º O custo do imóvel, para o vendedor, quando adquirido por doação, herança ou legado, é o valor constante do respectivo instrumento de transferência da propriedade, transcrito no registro próprio.
Parágrafo único. Quando o valor da aquisição da propriedade constante do respectivo instrumento fôr inferior ao que tenha servido de base para o pagamento do impôsto de transmissão, observar-se-á o disposto no art. 6º.

8.A Corte Suprema, pela formalização das duas Súmulas, deixou claro que a venda de imóveis herdados, ocorrida antes da definição legal da base de cálculo de incidência, não gerava conseqüência tributária, muito embora pudesse ser o ganho incluído no campo de incidência do IRPJ como acréscimo patrimonial. A partir do momento em que o ato formal e materialmente legislativo, na expressão de Sacha Calmon, passou a vigorar, o imposto sobre o ganho de capital auferido na alienação de imóveis herdados passara a ser devido, porque já havia Lei editada antes do fato gerador que informava sobre a apuração de tal obrigação. Vale dizer: estabelecia base de cálculo.

9. Posteriormente a matéria passou a ser disciplinada, de forma diversa, por outro ato legal, Decreto Lei nº 1.641/78, sendo o art. 7º da Lei nº 3.470 de 1.958 revogado tacitamente. Esta alteração de ordem legal, que se instaurou a partir do dia primeiro de janeiro de 1.979, deixou de expressar formalmente a situação particular dos imóveis herdados como fizera o antigo diploma lega. Em verdade a construção normativa do disposto no DL privilegiou outros critérios que não o da especialização das situações jurídicas civis que envolvem operações imobiliárias. Quanto à normatização da base de cálculo, em particular, tal DL se limitou a dizer das rubricas envolvidas na apuração do lucro imobiliário – lucro, valor de alienação e custo de aquisição- em acepção ampla, atribuindo ao Ministro da Fazenda competência para baixar normas complementares necessárias ao cumprimento do disposto no DL, nos seguintes termos:

Art 4º – O Ministro da Fazenda poderá baixar normas complementares necessárias à aplicação do disposto nos artigos anteriores.

10.Com fundamento na citada atribuição de poder normativo complementar, o Ilustre Senhor Mário Henrique Simonsen, então Ministro da Fazenda, baixou a Portaria MF nº 80 de 1.979 de onde se destaca a regra constante do item 1 :

Para efeitos do disposto na alínea “a” do § 3º do art. 2º , considera-se preço de aquisição de imóvel havido por herança, doação ou legado ou por outras formas de aquisição a título gratuito, o valor que serviu de base para o lançamento do respectivo imposto de transmissão ou, no caso de não ter sido o mesmo fixado, o valor de mercado à época da aquisição.

11.A interação do DL com a Portaria parecia atender plenamente o principio da estrita legalidade e, por isso, passou a ser de aplicação vinculada pelos agentes do fisco. Autos de Infração foram lavrados, os respectivos contenciosos judiciais foram instaurados, e, a matéria foi parar no STJ – Superior Tribunal de Justiça- que decidiu, a favor dos contribuintes alienantes de imóveis herdados, firmando jurisprudência na matéria. Transcreve- se a Ementa do julgado:

RECURSO ESPECIAL Nº 1.042.739 – RJ (2008/0064265-0)
RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
RECORRENTE : PAULINO CAMPOS DIAS GARCIA
RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. GANHO DECORRENTE DA ALIENAÇÃO DE IMÓVEL ADQUIRIDO POR HERANÇA. PORTARIA 80/79 DO MINISTRO DA FAZENDA. ILEGALIDADE. TRIBUTO INDEVIDO. PRECEDENTES.
1. Não se admite a tributação do imposto de renda sobre o ganho decorrente da alienação de bem imóvel adquirido por herança com fundamento na Portaria MF 80/79, uma vez que esse ato normativo tratou de matéria submetida à reserva legal. Precedentes: EREsp 23999 / RJ, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ 19.12.1997 e REsp 57415/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 10.04.1995.
2. Sendo possível dar provimento ao recurso especial sem analisar a suposta violação do art. 535 do CPC, essa questão fica prejudicada.
3. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília, 26 de agosto de 2008 (data do julgamento). Ministro Castro Meira/ Relator

12.Enfaticamente, a Corte Superior rejeitou a tributação com base na aventada Portaria MF 80/79 em razão do ato do Poder Executivo ter versado sobre matéria submetida à reserva legal (base de cálculo). Assim foi necessária a revogação dos artigos 1º a 4º do DL nº 1.641/78 pela Lei 7.713/88, que passou a disciplinar a tributação dos ganhos de capital na venda de imóveis, por pessoas físicas, inclusive a venda de imóveis herdados, a partir de 1º de janeiro de 1.989. Releva-se, no ponto: a correção se deu por via legislativa.

Securitizadoras de crédito e lucro presumido

13.As empresas de securitização de créditos, são sociedades anônimas constituídas como Sociedades de Propósito Especifico – SPE- que dependem de Lei autorizadora para sua criação. Portanto, nem toda cessão de crédito pode ser considerada ato de securitização. Em se tratando de securitização de créditos, pode-se se dizer que não há liberdade de contratação e formação da sociedade; somente a lei pode dizer quais os créditos que podem ser objeto de securitização.

14.O ato regular de securitização de um crédito implica em tomar recursos no mercado financeiro, na forma permitida em lei – emissão de debêntures, por exemplo- ou dos acionistas da entidade, sob a forma de capital social, e aplicar estes recursos na aquisição de créditos (recebíveis) da fonte em que os créditos foram gerados. A viabilidade financeira da operação ocorre pela via da concessão de deságio na cessão do crédito por parte do cedente ao cessionário, permitindo, assim, que os riscos de certo crédito sejam diluídos no mercado secundário. Portanto o lucro de uma securitizadora de crédito é exclusivamente de natureza financeira.

15.Todos nós sabemos que resultados financeiros nunca foram e nem poderiam ser objeto de presunção de lucro, eis que, por si só o resultado financeiro já surge definido e apurado no mundo do direito. Não se pode presumir aquilo que está apurado ao certo e exato. De outro lado, a tributação simplificada, conceituada em lei como lucro presumido, tem estrutura própria de formação da base de cálculo que se pode demonstrar, de forma esquemática, com a tabela que segue:

ELEIÇÃO DA ATIVIDADE ECONÔMICA PARÂMETRO

DA PRESUNÇÃO

COEFICIENTE LEGAL DE PRESUNÇÃO LUCRO PRESUMIDO MAIS GANHOS EXTRAORDINÁRIOS
COMÉRCIO RECEITA BRUTA 8 % LUCRO PRESUMIDO
SERVIÇOS RECEITA BRUTA 32% LUCRO PRESUMIDO
GANHOS DE CAPITAL ————— —————- TOTALIDADE DOS GANHOS
GANHO FINANCEIRO —————– —————- TOTALIDADE DOS GANHOS
SOMATÓRIA DAS PARCELAS BASE DE CÁLCULO DO LUCRO PRESUMIDO

 

16.Não é difícil perceber que as entidades de securitização de créditos jamais poderiam ser autorizadas a optar pela tributação no regime tributário do lucro presumido, pois do ponto de vista econômico financeiro, esta atividade era incompatível com a estrutura técnica do regime. Todavia, a RFB, pelo menos em duas oportunidades (Solução de Consultas exaradas pelas 7ª e 10ª Regiões Fiscais) se manifestou no sentido de que a Lei não impedia as securitizadoras de ingressarem no regime tributário do lucro presumido. Por não estarem, literalmente, impedidas na lei de regência do regime, estavam estas sociedades de propósito especifico autorizadas, por decorrência, a optar pela tributação simplificada- lucro presumido-.

17.De fato a Lei (art. 36 da Lei nº 8981/95, sucessivamente alterado até o art. 18 da Lei nº 9.718/98) que impunha a obrigatoriedade de apuração do lucro real não citava expressamente as entidades de securitização de crédito e nem poderia fazê-lo; em 1.995 não existia empresa de securitização de crédito como sociedade anônima especialmente disciplinada em lei. Como instituto jurídico próprio a figura da securitização de créditos surgiu em 1.997 (Lei nº 9.514/97).

18. Em rigorosa observância da estrita legalidade na determinação de base de cálculo, foi, então, inserto, na MP nº 472 de 2.009, o art. 22 que alterou o art. 18 da Lei nº 9.718/98 para fazer inserir, no rol das empresas obrigadas a apuração do lucro real, as securitizadoras de créditos. Vê-se assim que foi necessária a produção legislativa de ato formal com força de Lei para que o mandamento constitucional da legalidade da tributação fosse cumprido pelo ente público. A interpretação econômica, mesmo que revestida de toda a lógica sistêmica, sucumbia frente ao rigor do primado jurídico da estrita legalidade, restando, ao ente tributante, buscar solução legislativa para correção de verdadeira anomalia do sistema normativo.

Veículos usados

19.A revenda de veículos usados, por parte de estabelecimentos comerciais dedicados a esta atividade, foi objeto de instituição, por lei ordinária, de técnica especial inominada de tributação (Lei nº 9.716/98 art. 5º), nos termos que seguem:

Art. 5º As pessoas. jurídicas que tenham como objeto social, declarado em seus atos constitutivos, a compra e venda de veículos automotores poderão equiparar, para efeitos tributários, como operação de consignação, as operações de venda de veículos usados, adquiridos para revenda, bem assim dos recebidos como parte do preço da venda de veículos novos ou usados.
Parágrafo único. Os veículos usados, referidos neste artigo, serao objeto de Nota Fiscal de Entrada e, quando da venda, de Nota Fiscal de Saída, sujeitando-se ao respectivo regime fiscal aplicável às operações de consignação.

20. A Lei foi, então, regulamentada por uma Instrução Normativa expedida pela antiga Secretaria da receita Federal sob o numero 152/98, de onde se destaca o art. 2º:

Art. 2º Nas operações de venda de veículos usados, adquiridos para revenda, inclusive quando recebidos como parte do pagamento do preço de venda de veículos novos ou usados, o valor a ser computado na determinação mensal das bases de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido, pagos por estimativa, da contribuição para o PIS/PASEP e da contribuição para o financiamento da seguridade social – COFINS será apurado segundo o regime aplicável às operações de consignação.
§ 1º Na determinação das bases de cálculo de que trata este artigo será computada a diferença entre o valor pelo qual o veículo usado houver sido alienado, constante da nota fiscal de venda, e o seu custo de aquisição, constante da nota fiscal de entrada.
§ 2º O custo de aquisição de veículo usado, nas operações de que trata esta Instrução Normativa, é o preço ajustado entre as partes.

21.A notória diferença desta técnica especial de apuração, em relação às de ordem geral, é que todas as bases de cálculos (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), destes comerciantes, são formadas pelas diferenças havidas entre os preços de alienação e os preços de aquisição das mercadorias vendidas. Em outras palavras, na operação de venda não se toma o faturamento como parâmetro de aferição de base de cálculo.

22.O aparente privilégio se traduz, em verdade, em uma técnica de tributação introduzida no sistema normativo para compatibilizar a carga tributária com a capacidade contributiva dos agentes econômicos. O comércio de veículos usados se assemelha aos negócios com commodities porque a margem de lucro é infirma se comparada ao valor de mercado do ativo negociado. No sistema geral tal atividade poderia ser inviabilizada pelas incidências do PIS e da COFINS sobre o faturamento.

23.Na forma como introduzida no sistema normativo atual, está técnica de tributação pode ser aplicada em qualquer regime tributário – lucro real, presumido ou arbitrado-. Por isso não se pode confundir a técnica de tributação com os regimes tributários que permaneceram inalterados em suas disciplinas próprias.

24.A construção normativa desta técnica de tributação se valeu do instituto legal do Contrato Estimatório, ou, Consignação Mercantil, previsto expressamente em nosso Código Civil – arts. 534 a 537-. Como instituto de Direito Privado, por excelência, a Consignação Mercantil encerra atos próprios em que o Consignante entrega bem móvel para que o Consignatário possa revendê-lo, por sua conta e ordem, pagando ao Consignante o preço estimado, ou devolver o bem móvel em prazo certo, caso não o venda. A Consignação Mercantil não se confunde com qualquer tipo legal de intermediação de negócios e nem sequer se trata de prestação de serviço porque sempre estará presente a OBRIGAÇÃO DE DAR – pagar o preço do bem alienado ou devolver o bem caso não ocorra a venda, no prazo da consignação-.

25.A questão da estrita legalidade na determinação da base de cálculo dos tributos, surge em situação de Lucro Presumido, posto, também, como regime tributário, à disposição dos comerciantes de veículos usados. Como já vimos na redação da IN, o comando legal determina que, no procedimento de apuração da base de cálculo, seja o faturamento substituído pela diferença entre o preço de alienação e o preço de aquisição do veículo usado; isto é: sai o faturamento e entra o lucro bruto como parâmetro na determinação das bases de cálculos (tipicidade da tributação). Quando se fala de Lucro Presumido há de se perpassar, necessariamente, pela vinculação do COEFICIENTE DE PRESUNÇÃO à atividade econômica. Esta vinculação decorre de Lei e não pode ser deduzida pela Administração ou mesmo por seus agentes. Assentar um coeficiente de presunção é matéria submetida à reserva legal nos termos constantes do art. 97 do CTN – caput c/c com o inciso IV- porque somente a Lei pode fixar base de cálculo, e o coeficiente de presunção é parte indissociável da formação da base de cálculo.

27.Neste ponto, a primeira surpresa surge com a interpretação dada pela Secretaria da Receita Federal, em processo de consulta, cuja ementa se transcreve, de que o coeficiente de presunção para estas situações seria de 32%, ou seja, o mesmo coeficiente aplicado à intermediação de negócios ( corretagem) e à prestação de serviços:

Processo de Consulta nº 21/01
Órgão: Superintendência Regional da Receita Federal – SRRF / 5a. Região Fiscal
Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ
Ementa: LUCRO PRESUMIDO. REVENDA DE VEÍCULOS USADOS. EQUIPARAÇÃO À OPERAÇÃO DE CONSIGNAÇÃO. BASE DE CÁLCULO. ALÍQUOTA.
Para a determinação da base de cálculo do imposto de renda, pelo lucro presumido, aplica-se o percentual de 32% sobre a diferença apurada entre o preço de venda do veículo usado e o respectivo custo de aquisição.
Dispositivos Legais: Lei nº 9.716, de 26 de novembro de 1998, art.5º; Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999, (RIR) art. 519, § 1º, inciso III, b; IN SRF nº 152/98, de 16 de dezembro de 1998, arts. 1º e 2º.
ADALTO LACERDA DA SILVA – Superintendente
(Data da Decisão: 22.08.2001 31.10.2001)

28.Posteriormente a interpretação volta ser confirmada na edição da IN SRF 390 de 2004 de onde se destaca os artigos específicos da matéria:

Art. 91. A pessoa jurídica sujeita à incidência da CSLL com base no resultado presumido ou arbitrado, que tenha como objeto social, declarado em seus atos constitutivos, a compra e venda de veículos automotores, deverá observar, quanto à apuração da base de cálculo respectiva, o disposto no art. 96.
Das Operações com Veículos Usados
Art. 96. (…)
§ 2º Considera-se receita bruta, para efeito deste artigo, a diferença entre o valor pelo qual o veículo usado tiver sido alienado, constante da nota fiscal de venda, e o seu custo de aquisição, constante da nota fiscal de entrada.
§ 3º Na determinação da base de cálculo estimada e do resultado presumido ou arbitrado, aplicar-se-á o percentual de 12% (doze por cento) sobre a receita bruta, definida no § 2º, auferida nos períodos de apuração ocorridos até 30 de agosto de 2003, e o percentual de 32% (trinta e dois por cento) para os períodos ocorridos a partir de 1º de setembro de 2003.

29.Salvo melhor juízo, nos parece que esta interpretação não pode prosperar. Primeiro porque não há na Lei, que rege o Lucro Presumido, linha especial a declinar, em apartado, a atividade de revenda de veículos usados como atividade eleita para vinculação de um coeficiente de presunção especifico. Segundo porque o art. 5º da Lei nº 9.716/98, em momento algum, deixou de reconhecer a natureza jurídica de compra e venda mercantil – ato de comércio- dos negócios realizados pelos comerciantes de automóveis usados; o citado comando legal apenas estabeleceu qual seria o parâmetro a ser empregado como variável financeira na apuração das bases de cálculo das exações que menciona. Terceiro porque nem mesmo o legislador ordinário pode alterar conceitos do direito privado para definir competências tributárias estatuídas na Constituição Federal; equiparar venda de veículos usados à prestação de serviços ou intermediação de negócios atrairia a competência dos municípios para exigir o Imposto Sobre Prestação de Serviços.

30.De outro lado o texto legal – art. 5º da Lei nº 9.716/98 – é enfático ao assentar que é opção do comerciante, de veículos usados, proceder à equiparação da venda à operação de consignação. Feita a opção, tanto a compra e como a venda ficam submetidas ao regime fiscal aplicável às operações de consignação. E que regime fiscal é este? Ora, queremos crer que a expressão usada pelo legislador foi empregada no sentido de levar o destinatário da norma, a saber, que somente a diferença, havida entre o preço de venda e o preço de compra, seria objeto de tributação, desde que cumpridas todas as obrigações acessórias inerentes à prática da consignação mercantil, como emissão da Nota Fiscal de Entrada e emissão da Nota Fiscal de Saída. Esta equiparação não decorreu de criação jurídica de conceito tributário próprio, e nem inaugurou regime tributário diverso dos já existentes; somente fixou um dos parâmetros (o financeiro) das base de cálculo em caráter especialíssimo.

31.Portanto o coeficiente de presunção a ser aplicado seria aquele vinculado por Lei aos atos de comércio e não à prestação de serviços, ou, á intermediação de negócios. Válida, neste sentido, é a lição de Sacha Calmon quanto à obscuridade da lei: somente a lei, como ato formal produzido no âmbito do Poder Legislativo poderia dizer o que está sendo pretendido pela RFB com expedição de ato administrativo, visto que estamos frente à matéria submetida à reserva legal.

Conclusão

32.A escolha dos casos citados foi aleatória. Existem outros casos que poderiam ser descritos para demonstrar a prática do princípio da estrita legalidade nas contendas entre a administração e os administrados- rateio de custos e tributação das despesas recuperadas; contratos de leasing versus compra e venda a prazo; receita estimada em contratos de mútuo graciosos dentro do mesmo conglomerado financeiro, entre outros-. Resta afirmar que os limites da estrita legalidade estão difusos no ordenamento desde a elaboração legislativa do comando legal, passando pela formulação das normas complementares até à caracterização de infrações em casos de ação fiscal direta.
- Publicado pela FISCOSoft em 11/03/2010

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

 

Substância econômica versus forma jurídica nas operações de cobertura (HEDGE). Contabilização versus tributação

I – Introdução

Recentemente, a Comissão de Valores Mobiliários (Deliberação nº 604 de 19 de novembro de 2.009) aprovou os Pronunciamentos Técnicos CPC nºs 38, 39 e 40, para vigorar a partir do encerramento do exercício social de 2.010, aplicando-se ainda às demonstrações financeiras de 2.009 que serão ajustadas para efeito de comparação com as de 2.010.

Tais atos normativos versam sobre Instrumentos Financeiros e abordam a contabilização, a mensuração e a divulgação destes negócios.

Os limites conceituais que demarcam a expressão, “Instrumento Financeiro”, estão expressos no item 11 do Pronunciamento CPC nº 39. A leitura do citado item 11 revela que todo e qualquer contrato que dê origem a um ativo financeiro para a parte e a um passivo financeiro para a contraparte se insere no conceito de instrumento financeiro desde que o negócio possa ser liquidado por caixa (circulação física ou escritural de moeda) ou por meio de outro ativo financeiro.

Neste mesmo campo de definição ainda está inserta a figura do “Instrumento Patrimonial” designada como sendo todo contrato que indique o direito de um titular participar nos ativos de uma entidade após a dedução de todos os seus passivos (Recibo de Ações, Bônus de Subscrição, Debêntures Conversíveis, Partes Beneficiárias e outros semelhantes ou idênticos aos direitos de um acionista).

O Pronunciamento Técnico CPC nº 38 ainda (nos itens 4 e 5) indica os negócios que estão excluídos do alcance do ato, ainda que reúnam as características gerais dos Instrumentos Financeiros ( são os casos especiais para os quais existem Pronunciamentos específicos, como leasing, por exemplo), bem como informa do o alcance sobre contratos de compra ou de venda que possam vir a ser liquidados como se instrumentos financeiros fossem (liquidados pelo valo líquido antes do vencimento, por meio de entrega de outros ativos financeiros e desde que não estabeleçam item não financeiro para entrega ou tenham por objeto ativo de uso da entidade).

Em 19 de Novembro de 2.009, a CVM ainda aprovou (Ofício- Circular/CVM/SNC/SEP/ Nº 03/2009) a Orientação OCPC nº 3 que em seu item “7″ traz importante definição conceitual, nos seguintes termos:

Definição de derivativo
Derivativo é um instrumento financeiro ou outro contrato dentro do alcance desta Orientação que possui todas as três características seguintes:
(a) seu valor se altera em resposta a mudanças na taxa de juros específica, no preço de instrumento financeiro, preço de commodity, taxa de câmbio, índice de preços ou de taxas, avaliação (rating) de crédito ou índice de crédito, ou outra variável, às vezes denominada “ativo subjacente”, desde que, no caso de variável não financeira, a variável não seja específica a uma parte do contrato;
(b) não é necessário qualquer desembolso inicial ou o desembolso inicial é menor do que seria exigido para outros tipos de contratos onde seria esperada uma resposta semelhante às mudanças nos fatores de mercado; e
(c) deve ser liquidado em data futura.

Como se pode perceber a definição de derivativo pode ultrapassar o conceito de instrumento financeiro desde que todos os requisitos caracterizadores de um derivativo clássico estejam presentes nos contratos. Por esta razão estes derivativos não clássicos seguirão as determinações contábeis impostas pelos Pronunciamentos em questão. Vejamos a situação descrita no item “4″ do Pronunciamento CPC nº 38, “in verbis:

“4 Encontram-se dentro do alcance deste Pronunciamento os seguintes compromissos referentes a empréstimos:
(b) compromissos referentes a empréstimos que podem ser liquidados pelo valor líquido em dinheiro ou entregando ou emitindo outro instrumento financeiro. Esses compromissos referentes a empréstimos constituem derivativos”

Apesar da redação abstrata ousamos lançar um caso imaginário para que o leitor possa sedimentar a interpretação do texto:

PASSO I
Certa controlada estrangeira, sediada em território brasileiro, importa da controladora sediada nos Estados Unidos um equipamento fabril para sua linha de produção, fazendo um PASSIVO de importação em moeda estrangeira – dólar americano-;
PASSO 2
Para evitar o risco cambial, a empresa importadora entrega moeda nacional a uma Instituição Financeira sediada no País, a qual em troca da antecipação assume o compromisso de liquidar o passivo em moeda estrangeira na data do vencimento. Para a instituição financeira a operação se consubstancia em captação de recursos (“funding”) para a qual incorre em determinado custo e a empresa comercial em determinado ganho financeiro.
PASSO 3
O contrato entre a Empresa Comercial e a Instituição Financeira será considerado um DERIVATIVO nos termos do Pronunciamento CPC nº 38.
PASSO 4
O Derivativo será mantido no Ativo da Empresa Comercial sendo constantemente avaliado pelo seu justo valor em concomitância com o PASSIVO em moeda estrangeira gerado pela importação do equipamento e também avaliado pelo seu justo valor. O resultado líquido (net da operação) a ser reconhecido pelo regime de competência será a justaposição destas avaliações mensais (variação cambial ativa contra variação cambial passiva, mais ajustes da taxa de juros embutida). Frise-se, ainda, que o objeto protegido é um passivo financeiro em moeda estrangeira e não o equipamento importado.

Deste exemplo o leitor poderá deduzir que prevalece, para o Direito Comercial inovado, a SUBSTÂNCIA ECONÔMICA DA OPERAÇÃO e não as formas jurídicas adotadas, princípio este, aliás, presente em todos os citados Pronunciamentos Técnicos.

II – Operações de cobertura de riscos ( HEDGES)

“Hedge accounting” é a expressão de língua inglesa, usada internacionalmente para designar uma técnica de contabilização especial a ser aplicada, compulsoriamente, no caso de operações de hedge. Esta forma especial de registro contábil veio no âmbito dos referidos Pronunciamentos porque a concretude de tais negócios ocorre com o emprego de contratos derivativos.

“Essa contabilização tem como objetivo aplicar o regime de competência para essas operações de forma que as variações no valor justo do instrumento de hedge (derivativo) e do item objeto de hedge ( uma dívida, por exemplo) sejam reconhecidas no resultado do exercício concomitantemente” ( Sumário do CPC nº 38, item 11).

A palavra inglesa “hedge” pode ser traduzida para o português como sendo “cerca”, ou, “muro de proteção”. Nos mercados, financeiro e de capitais, tem o sentido de proteção contra oscilações de mercado – cambial, juros de mercado, riscos de crédito (rating), preços de commodities e outros – passíveis de mensuração com alto grau de confiabilidade. Por isso nem todos os riscos que afetam uma entidade empresarial podem ser cobertos por operações qualificadas como sendo hedge. O risco de obsolescência de um ativo físico, por exemplo, não pode ser eleito ou designado para uma operação de hedge (CPC 38, página 100, Apêndice AG110), por falta de confiança da comunidade econômica na mensuração.

Nas operações de hedge dois elementos nucleares serão sempre identificados; o instrumento de hedge (geralmente um contrato derivativo) e o item protegido ou “hedgeado” na citação coloquial de operadores de mercado. Entretanto a presença dos elementos econômicos nucleares não é suficiente para que uma entidade possa lançar mão da contabilidade especial das operações de hedge. Outros requisitos de ordem instrumental haverão de ser cumpridos para a efetiva compensação de resultados advindos das variações de mercado. Estes requisitos estão expressamente mencionados no item 88 do Pronunciamento CPC 38, listados em letras de “a” até “e” que tentamos simplificar como segue:

letras REQUISITO; DESCRIÇÃO
a Designação (eleição) e documentação formal do hedge; o “animus” da valoração jurídica não se comprova somente com os lançamentos contábeis;
b Comprovar a efetividade do hedge durante todo o transcurso da operação através da demonstração matemática de que as variações no instrumento do hedge comparadas com as variações no item protegido ficam sempre no intervalo de 80% a 125% (o intervalo é apurado pela divisão de uma variação sobre a outra) e convertido, o coeficiente, em percentagem).
c Exigência especifica para o hedge de fluxo de caixa
d Confiabilidade de mensuração do risco coberto e na determinação do justo valor do instrumento de hedge
e Durante todos os períodos contábeis o hedge deve ser avaliado e considerado eficaz até o final do lapso temporal para o qual foi designado.

 

Foram, também, as operações de hedge classificadas em três categorias distintas, a saber:

Hedge de valor justo quando o item protegido – um ativo ou um passivo- será mensurado a valor de mercado impactando o resultado contábil da entidade; neste caso o instrumento de hedge também será mensurado a justo valor sendo o resultado justaposto ao efeito derivado da avaliação do item protegido; vale dizer, o resultado econômico da operação é que será registrado em contas de resultado no regime de competência;

Hedge de fluxo de caixa; situação clássica de empresas que mantém estoque para venda de commodities cujos preços flutuam no mercado a vista e no mercado de futuros;os derivativos serão contratados a fim de compensar variações estimadas no fluxo de caixa futuro da entidade;

Hedge de investimentos, no exterior, sujeitos às mudanças de taxas de câmbio que impactam a Conversão de Demonstrações Contábeis.

Particularmente nos casos de hedge de fluxo de caixa, as entidades deverão decompor a variação havida no instrumento financeiro em duas parcelas definidas como:

1ª parcela efetiva do hedge (ganho ou perda) a ser contabilizada no PL como ajuste de avaliação patrimonial; esta parcela é apurada pela magnitude da compensação ocorrida entre a variação acontecida no fluxo de caixa e a variação no instrumento financeiro; esta parcela somente será levada a conta de receita ou despesa quando o ocorrer a transação “hedgeada” ou o ativo ou passivo protegido forem realizados contabilmente.

2ª parcela não efetiva que é aquela resultante da diferença entre a parcela efetiva e o total da variação do instrumento financeiro; havendo parcela não efetiva do ganho ou perda com o instrumento de hedge, esta será diretamente reconhecida em conta de receita ou despesa, no resultado do período.

Vejamos um exemplo numérico para esta hipótese de hedge de fluxo de caixa:

 

III – Tributação das operações financeiras- Disciplina vigente

Infere-se que no emprego desta técnica contábil, acima descrita, prevalece o princípio da SUBSTÃNCIA ECONÔMICA da operação e não os resultados dos atos e fatos jurídicos isoladamente considerados. Todavia este novel critério tem seu campo de aplicação circunscrito aos limites do Direito Privado. Até que a disciplina tributária atual não seja alterada, os resultados individuados dos instrumentos financeiros continuarão a ser tributados na fonte e na declaração das pessoas jurídicas, ainda que vinculados às operações de hedge. Neste sentido citamos o disposto no art. 5º da Lei 9.779 de 1.999 que preceitua:

Art. 5º Os rendimentos auferidos em qualquer aplicação ou operação financeira de renda fixa ou de renda variável sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte, mesmo no caso das operações de cobertura (hedge), realizadas por meio de operações de swap e outras, nos mercados de derivativos.

É notório o reforço semântico aplicado pelo legislador ordinário; este fez questão de assentar que as operações de cobertura de risco são tributadas na fonte.

A razão desta ênfase parece ter origem em certa corrente jurídica que lançou a tese de que os ganhos em operações de hedge teriam natureza indenizatória, não correspondendo efetivamente a acréscimo patrimonial auferido, por que a ocorrência do ganho e dava em concomitância com a perda incorrida no item ou transação protegida. A matéria foi apreciada pelo STJ no Recurso Especial nº 591.357- RJ (2.003/0162507-5) onde ficou assentado na Ementa do Acórdão:

4. A operação de swap constitui típica operação ensejadora do fato gerador simples do imposto sobre a renda, posto que representa acréscimo patrimonial, obtido na troca de financiamentos em taxas diversas, sobre um montante principal, daí por que ser tributado na fonte.

Nas operações de cobertura de riscos, os contribuintes deverão observar a diversidade de regimes tributários em relação aos mercados de contratação do instrumento derivativo empregado, conforme esquema que segue:

MERCADOS BASE DE CÁLCULO PERIÓDO DE APURAÇÃO IRFON LUCRO REAL DAS NÃO FINANCEIRAS- PERDAS
Bolsas, Mercados de Balcão Ganhos Líquidos nos Mercados de:

-opções

- termos

- futuros

Mensal com pagamento de estimativa se for o caso Antecipação do devido no mês e na declaração, se for o caso As perdas só podem ser deduzidas até o limite dos ganhos
De Derivativos – mercado financeiro- Renda Variável Encerramento do contrato, ou da posição, para as não financeiras; Antecipação do devido na declaração As perdas só podem ser deduzidas até o limite dos ganhos, sob condição de registro em entidades próprias – CETIP, por exemplo-
Outros no SFN Renda Fixa No pagamento ou crédito ou na apropriação do deságio auferido Antecipação do devido na declaração Não ocorrência

 

Por outro lado é oportuno que se lembre que o Direito Tributário assentou conceito próprio de operações de cobertura de riscos há muitos anos atrás, quando da edição da Lei nº 8.981 de 1.995 (art. 77, §§ 1º e 2º), até hoje inalterado e assim escrito:

§ 1º ((…)) consideram-se de cobertura (hedge) as operações destinadas, exclusivamente, à proteção contra riscos inerentes às oscilações de preço ou de taxas, quando o objeto do contrato negociado:

a) estiver relacionado com as atividades operacionais da pessoa jurídica;

b) destinar-se à proteção de direitos ou obrigações da pessoa jurídica.

§ 2º O Poder Executivo poderá definir requisitos adicionais para a caracterização das operações de que trata o parágrafo anterior, bem como estabelecer procedimentos para registro e apuração dos ajustes diários incorridos nessas operações.

Vale dizer, o legislador tributário fez uso do advérbio “EXCLUSIVAMENTE” para vincular as espécies de riscos da cobertura (preços e taxas) às atividades operacionais da empresa ou a determinados direitos ou obrigações de uma pessoa jurídica numa verdadeira matriz cruzada que pode assim ser demonstrada:

 

Quanto ao estabelecimento dos demais requisitos caracterizadores das operações, a Lei Ordinária delegou ao Poder Executivo a competência regulamentar no âmbito do Direito Tributário. Esta incursão do legislador tributário, de per si, é suficiente para autorizar a conclusão de que a operação de cobertura de risco se caracteriza como situação de relevância jurídica e não simplesmente um conceito do mundo das finanças. Caberia, portanto, ao Poder Executivo, neste diapasão, o estabelecimento de instrumentos específicos de aferição destas operações para que os operadores do direito pudessem, com segurança, perpetrar as conseqüências tributárias próprias. Na falta desta regulamentação certas situações são elevadas à categoria de operações de cobertura de risco simplesmente porque as entidades estão munidas de autorização emitida pelo Banco Central do Brasil para a prática de certa operação – caso de bancos estrangeiros que operam hedge de patrimônio líquido, por determinação dos controladores-.

Agora surgem, no Direito Privado, ferramentas próprias para a caracterização de uma operação como sendo de cobertura de risco e vale relembrá-las no ponto:

- designação formal (documentação) do hedge;

- a eficácia do hedge, numericamente quantificada pelo coeficiente resultante da divisão entre a cobertura auferida e a perda incorrida;

- escrituração contábil própria.

Não há dúvida que este conjunto de requisitos, aprovado pela Comissão de Valores Mobiliários, passa a fazer parte da legislação comercial complementar. E diante desta constatação resta o seguinte questionamento: As autoridades tributárias poderão fazer uso destas ferramentas para alterar de ofício a eleição espontânea de um contribuinte, frente a uma operação financeira ou no mercado de capitais, como sendo uma operação de cobertura de risco? Em outras palavras: Poderão as autoridades tributárias aplicar as disposições emanadas do Comitê de Pronunciamentos Contábeis como sendo atos regulamentares do Poder Executivo, na forma da autorização expressa na Lei nº 8.981/95?

Salvo melhor juízo, entendemos que não. O poder regulamentar do CPC não o autoriza a ditar normas com finalidade tributária.

Para finalizar ainda cabe ressaltar que a coexistência de normas com mandamentos diversos nem sempre revela o vício da antinomia de lei. Em verdade o conflito entre as normas legais é apenas aparente. Cada sistema jurídico tem seus próprios objetivos; as regras podem ser concorrentes, mas não conflitantes.

IV- Conclusões

PRIMEIRA: A partir de 2.010 as entidades deverão se preocupar com a documentação formal das operações de cobertura de risco; somente a escrituração comercial ou a mera declaração serão insuficientes para atender o conjunto de requisitos probatórios;

SEGUNDA: No Direito Privado o conceito de hedge passa a ser cerrado;

TERCEIRA: O cômputo dos ganhos ou das perdas na apuração das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL não depende da substância econômica da operação e sim das regras de tributação das operações de renda fixa ou de renda variável;

QUARTA: Caso o conceito tributário de operação de cobertura de risco não seja reformado, por lei, em futuro próximo, caberá ao Poder Executivo, no exercício de seu poder regulamentar, incorporar a disciplina estabelecida pelo CPC.

QUINTA: Uma operação iniciada e designada como hedge pode ser reclassificada espontaneamente como uma operação de renda fixa ou de renda variável; o contrário não se admite porque a designação é condição preliminar na classificação da operação.

- Publicado pela FISCOSoft em 21/12/2009

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

 

Regime tributário das Day Trades para pessoas físicas

Para fins tributários, “Day Trade” é uma operação de renda variável sujeita à disciplina especial cujas regras foram construídas ao longo do tempo de forma a constituir um verdadeiro regime tributário diferenciado. O regime se caracteriza pelo estabelecimento de alíquotas e formas de compensação de perdas diferentes daquelas que prevalecem para a Renda Variável. Day Trade é espécie enquanto Renda Variável é gênero.

Ocorrência da operação de Day Trade

Day Trade é a operação iniciada e encerrada no mesmo dia e com o mesmo ativo objeto. O encerramento da posição pode ser total ou parcial. A operação pode ser iniciada por uma compra ou por uma venda, mas será sempre encerrada por uma operação contrária àquela do inicio do dia.

Caso a operação se inicie por uma venda, e se encerre por uma compra do mesmo ativo objeto, os estoques possuídos pelo investidor no dia anterior não serão alterados, ou seja, os estoques do dia anterior não influenciarão na apuração da “day trade”. O mesmo vale para o caso de se iniciar a operação de “day trade” por uma compra.

O termo final da day trade se dará sempre no mesmo dia da ocorrência do termo inicial até o limite quantitativo da operação que abriu a “day trade”. Em termos de quantidade de ativos objeto o termo final pode ser igual ou inferior ao termo inicial. Caso o termo final, em quantidade do ativo objeto, seja superior ao termo inicial, a quantidade a ser considerada Day Trade fica limitada ao termo inicial. Exemplo numérico:

MERCADO A VISTA/ CONTROLE DO ESTOQUE
CORRETORA ABRÓLIOS SOCIEDADE ANOMINA
CONTA DEPÓSITO Nº 9999-99
ATIVO AÇÕES PREFERENCIAIS DA VALE
CÓDIGO DE NEGOCIAÇÃO DO ATIVO VALE5
FISICO FINANCEIRO R$
DATA COMPRA VENDA SALDO COMPRA VENDA SALDO
10-09-09 10.000 ZERO 10.000 330.000 ZERO 330.000
Preço médio de aquisição: R$33,00
MERCADO A VISTA/ OPERAÇÕES DE 11 DE SETEMBRO DE 2.009
CORRETORA ABRÓLIOS SOCIEDADE ANOMINA
CONTA DEPÓSITO Nº 9999-99
ATIVO AÇÕES PREFERENCIAIS DA VALE
CÓDIGO DE NEGOCIAÇÃO DO ATIVO VALE5
FISICO FINANCEIRO R$
DATA COMPRA VENDA ORD. Pu R$ COMPRA VENDA SALDO
11-09-09 10.000 35,00 350.000 350.000
11-09-09 5000 34,00 170.000 180.000
APURAÇÃO DO CUSTO DA VENDA E DO GANHO LÍQUIDO EM RENDA VARIAVEL
CORRETORA ABRÓLIOS SOCIEDADE ANOMINA
CONTA DEPÓSITO Nº 9999-99
ATIVO AÇÕES PREFERENCIAIS DA VALE
CÓDIGO DE NEGOCIAÇÃO DO ATIVO VALE5
FISICO FINANCEIRO R$
DATA COMPRA VENDA SALDO COMPRA VENDA SALDO
10-09-09 10.000 ZERO 10.000 330.000 ZERO 330.000
11-09-09 ZERO 5.000 5.000 ZERO 165.000 165.000
Custo da venda apurado pelo p.m. de compra R$33.00
PRODUTO DA VENDA CUSTO DA VENDA GANHO LÍQUIDO
175.000,00 165.000,00 10.000,00
p.m. de venda R$35,00
APURAÇÃO DO RESULTADO EM DAY TRADE
TERMO INICIAL
ATIVO DATA OERAÇÃO QDE. ORDEM DA OPERAÇÃO VALOR
VALE5 11-09-09 VENDA 5.000 PRIMEIRA 175.000,00
TERMO FINAL
VALE5 11-09-09 COMPRA 5.000 SEGUNDA 170.000,00
Preço Médio de Encerramento da Day Trade: R$34,00
Resultado Positivo em Day Trade: R$5.000,00

 

Note-se que a operação foi finalizada por uma operação de compra, em quantidade inferior ao termo de abertura (venda), o que fez com que o estoque do investidor só fosse sensibilizado pela parcela que não integrou a Day Trade.

Destaca-se, também, que se por ventura, o valor do termo final fosse superior a R$175.000,00 haveria a ocorrência de uma perda em operação de Day Trade.

O exemplo numérico ainda pode externar outra dedução de ordem lógica jurídica: o investidor que pretendia manter em carteira 50% de seus ativos poderia ter simplesmente vendido 5.000 Vale5 auferindo um ganho tributável de R$10.000,00, restando em carteira os ativos pretendidos; com a realização da Day Trade o investidor agregou mais R$5.000,00 ao seu patrimônio financeiro e ainda conseguiu manter o volume de ativos que pretendia. A situação revela a autonomia da operação de Day Trade em relação ao patrimônio do investidor. Diga-se, de passagem que os mecanismos operacionais do mercado, permitiriam, inclusive, que a operação de Day Trade pudesse ocorrer “a descoberto”, isto é, sem que o investidor fosse titular da propriedade do ativo objeto que deu lastro a Day Trade. Assim se justifica a tributação em separado dos ganhos líquidos auferidos em renda variável.

A letra “a” do inciso I do §1º do art. 8º da Lei nº 9.959 de 2.000 dispõe sobre o conceito legal das operações de Day Trade, nos seguintes termos:

Art. 8º ((…))
§ 1º Para efeito do disposto neste artigo:
I – considera-se:
a) day trade: a operação ou a conjugação de operações iniciadas e encerradas em um mesmo dia, com o mesmo ativo, em que a quantidade negociada tenha sido liquidada, total ou parcialmente;

O conceito legal ainda foi devidamente explorado pela Instrução Normativa SRF nº 25 de 2.001, especialmente em seu artigo 31, de onde destacamos os seguintes parágrafos complementares:

§ 2º Para efeito do disposto neste artigo não será considerado o valor ou a quantidade de estoque do ativo existente em data anterior a da operação de day-trade.
§ 3º Na apuração do resultado da operação de day-trade serão considerados, pela ordem, o primeiro negócio de compra com o primeiro de venda ou o primeiro negócio de venda com o primeiro de compra, sucessivamente

Exclusões das ocorrências de operações de Day Trade

Infere-se da regra geral de ocorrência de uma operação de Day Trade que o investidor, em relação ao mesmo ativo objeto, assumirá posições contratuais contrárias ao longo de um mesmo dia. Iniciando o dia assumindo uma “POSIÇÃO COMPRADA” encerrará a Day Trade assumindo uma “POSIÇÃO VENDIDA”. O confronto destas posições indicará o resultado da operação.

Esta regra geral, todavia, comporta exclusões, que estão mencionadas de forma expressa nos incisos I e II do §12 do art. 31 da IN SRF nº 25 de 2.001:

Art. 31. (….)
§ 12. Não se caracteriza como day-trade:
I – o exercício da opção e a venda ou compra do ativo no mercado à vista, no mesmo dia;
II – o exercício da opção e a venda ou compra do contrato futuro objeto, no mesmo dia.

Os titulares de valores mobiliários, como é caso das ações adquiridas em bolsa, podem operar no mercado a vista e no mercado de opções de forma conjugada.

Denomina-se lançador da opção de compra aquele investidor que manda seu corretor lançar (vender) opção de compra de seu ativo objeto, indicando a série da opção e o prêmio desejado (preço da opção). Os contratos de opções são formados por séries padronizadas que indicam a data do vencimento do contrato e o preço pelo qual o contrato será liquidado pelo titular da opção (strike da opção).

Vamos nos valer ainda do mesmo exemplo numérico para aventar a hipótese de que nosso investidor, no mês de setembro de 2.009, tenha resolvido fazer uma venda coberta pelas ações Vale5 de sua carteira, com as seguintes características:

série VALEJ36 quantidade: 5.000 opções
Vencimento Valor do Prêmio Preço de Exercício
21-10-2009 0,50 por ação 35,75 (strike)

 

Efetuado o lançamento o investidor receberá R$2.500,00 reais e ficará aguardando o dia do vencimento das opções para saber se o resultado auferido será considerado ganho no mercado de opções ou se o valor recebido será agregado ao produto da venda definitiva das ações para apuração do ganho líquido no mercado a vista.

Admitindo-se que o titular das opções resolva exercer o seu direito de comprar porque, no dia 21 de Outubro de 2.009, as ações Vale5 estavam cotadas no mercado a vista a R$38,00 cada, fará o titular, então, o pagamento contratado (R$31,75 multiplicado por 5.000) no montante de R$158.750,00 ao exercido. Seu custo total (de quem exerceu o direito de compra) de aquisição será então de R$161.250,00 (R$158.750,00 mais R$2.500,00). Vendendo no mesmo dia, o lote de ações compradas pelo valor de R$190.000,00 (5.000 vezes R$38,00) o comprador/vendedor das opções terá um ganho no mercado a vista de R$28.750,00 (R$190.000,00 – R$161.250,00).

Houve no mesmo dia e com o mesmo objeto uma operação de compra e uma de venda que encerrou a posição comprada. Embora tenha ocorrido este encerramento de posição, a operação não será considerada operação de Day Trade para fins de incidência tributária, porque os ativos foram transferidos de um titular para outro, mediante movimentação física na custódia dos papeis e, ainda, o exercício da opção se consuma na consolidação de uma compra iniciada em data anterior (data em que foram adquiridas as opções de compra).

Alíquota diferenciada para Day Trade

A tributação em separado das operações de Day Trade foi instaurada pelo artigo 2º da Lei nº 11.033 de 2.004, “verbis”:

Art. 2º O disposto no art. 1º desta Lei não se aplica aos ganhos líquidos auferidos em operações realizadas em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros, e assemelhadas, inclusive day trade , que permanecem sujeitos à legislação vigente e serão tributados às seguintes alíquotas:
I – 20% (vinte por cento), no caso de operação day trade ;
II – 15% (quinze por cento), nas demais hipóteses.

O estabelecimento de alíquota diferenciada para a tributação das operações de Day Trade trouxe outras conseqüências além da própria majoração da antiga alíquota de 15% para 20%, como veremos nos tópicos seguintes.

Perdas incorridas em operações de Day Trade

Como regra geral, da tributação mensal dos ganhos auferidos em renda variável, está autorizada a compensação das perdas incorridas em determinados mês do ano calendário, com os ganhos líquidos auferidos nos meses subseqüentes, até o exaurir total da perda incorrida (Lei nº 8.981 de 1.995, art. 72 §4º).

Entretanto esta regra geral não se aplica as operações de Day Trade, seja pelo princípio de que a lei especial prevalece sobre a geral, seja pela interpretação sistemática do ordenamento que conduz à tributação em separado em razão da imposição de alíquota especifica, por disposição expressa de Lei. Tal inferência está em plena consonância com o disposto no Parágrafo Único do art. 12 da Instrução Normativa SRF nº 487 de 2.004 que vem assim expresso:

Parágrafo único. Os ganhos líquidos auferidos em operações day-trade serão apurados e tributados separadamente das demais operações realizadas em bolsa.

Para os casos de operações de Day Trade está em vigor a norma que determina procedimentos ordenados de compensação de perdas – §6º do art. 8º da Lei nº 9.959 de 2.000 – com a seguinte redação:

§ 6º As perdas incorridas em operações day trade somente poderão ser compensadas com os rendimentos auferidos em operações de mesma espécie (day trade), realizadas no mês, observado o disposto no parágrafo seguinte.
§ 7º O resultado mensal da compensação referida no parágrafo anterior:
I – (…)
II – se negativo, poderá ser compensado com os resultados positivos de operações de day trade apurados nos meses subseqüentes.

De plano anota-se que o inciso I do art. 7º está derrogado pela superveniência do art. 2º da Lei nº 11.033 de 2.004 que instituiu o regime tributário em separado das operações de Day Trade. Esta derrogação não permite, desde 1º de janeiro de 2.005, que perdas incorridas no mercado a vista, por exemplo, sejam somadas aritmeticamente – compensadas- aos ganhos em operações de day trade. Algo que foi legalmente admitido por certo tempo de vigência de alíquota única para renda variável e para Day Trade.

Como o leitor pode perceber o primeiro passo na compensação de perdas é a compensação das perdas com os ganhos auferidos no próprio mês das realizações das operações positivas e negativas. Embora a compensação seja sempre uma opção do contribuinte, ao exercê-la, o mesmo deverá se guiar fielmente pela regra estabelecida.

A regra instrumental vem escrita com o advérbio “somente”, indicando, claramente, uma imposição de rotina de atos a ser seguida. Dado este primeiro e compulsório passo e, se ainda houver perda não compensada no mês, será o saldo remanescente da perda controlado (estocado) até o mês seguinte para efeitos de ser realizada novamente a compensação. Não há limite temporal ao ato de compensar, mas a compensação sempre estará limitada, em cada mês de apuração, ao resultado positivo mensal auferido.

Caso o contribuinte adote procedimentos de compensação divergentes daqueles estabelecidos em Lei e houver prejuízo ao Fisco (por exemplo, em caso de alteração de alíquotas) o ato praticado será desconsiderado de ofício.

Tributação na fonte das operações de Day Trade

No mercado de capitais a incidência de fonte no ganho líquido, mensal, apurado em renda variável (0, 005%) e a incidência nos ganhos auferidos em Day Trade resultam em imposto de renda de fonte conhecido como “Dedo Duro”. A finalidade da tributação não é propriamente de arrecadar e sim de construir e manter um controle administrativo dos contribuintes que operam em renda variável. Pela via do recolhimento de pequenos valores a Administração toma conhecimento de todos os CPF(s) e bases de cálculo assumidas pelas corretoras intervenientes nas operações, quando estas corretoras apresentam a Declaração de Imposto Retido na Fonte-DIRF-.

Quanto à Day Trade a incidência de fonte está prevista em 1% sobre o ganho conforme disposto na Lei nº 9.959 de 2.000, art. 8º:

Art. 8º Os rendimentos auferidos em operações de day trade realizadas em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas, por qualquer beneficiário, inclusive pessoa jurídica isenta, sujeitam-se à incidência do imposto de renda na fonte à alíquota de um por cento.

Para fins de incidência de fonte a base de cálculo será sempre o rendimento auferido no dia, sendo considerado rendimento somente o resultado positivo auferido. Caso ocorra num único dia resultados positivos e resultados negativos, estes poderão ser compensados entre si, desde que o ordenante das operações tenha operado por intermédio de uma única instituição (§2º do art. 8º da Lei nº 9.959 de 2.000).

Esta regra diz respeito à compensação de resultados e não à compensação do tributo em si. Cuida-se de regra a ser observada pela instituição financeira que é responsável pela apuração e recolhimento do tributo.

Formas autorizadas de compensação do imposto de fonte

Ao final de cada período de apuração mensal, caberá ao contribuinte, Pessoa Física, reunir as notas de corretagem para apuração do valor a ser recolhido a título de imposto de renda incidente sobre rendimentos de operações de Day Trade; advirta-se, no ponto, que as corretoras somente são responsáveis pelo imposto de fonte.

Consolidados os resultados auferidos em uma ou mais corretora e sendo o resultado final positivo, configura-se a existência de base de cálculo para a aplicação da alíquota de 20%. Após a aplicação desta alíquota tomar-se-á conhecimento do valor da obrigação tributária a ser adimplida. Este valor não necessariamente será o valor efetivo a ser recolhido, justamente porque dele serão subtraídos os valores pagos na fonte a titulo de antecipação do valor devido. Portanto o que se paga na fonte é considerado antecipação do devido. Esta compensação deve ser feita em plano primeiro por que se trata de procedimento inerente à própria apuração da obrigação tributária.

Ainda que expressas em Lei ou em Atos Normativos, autorizações de compensação só terão relevância jurídica quando o total pago na fonte for superior ao devido no período mensal de apuração (situação de indébito tributário). Em outras palavras, quando o que foi pago na fonte superar o devido pela obrigação incorrida, no período de apuração.

Como vimos as finalidades destas incidências de fonte são de índole administrativa – Day Trade e Ganhos Líquidos em Renda Variável, têm a mesma natureza -. Assim sendo queremos crer que as autorizações de compensação previstas para o imposto de fonte da renda variável valem para o imposto de fonte de Day Trade.

Na redação do §7º do art. 10 da Instrução Normativa SRF nº 487 de 2.004 não fora feita distinção para o imposto de fonte de Day Trade, embora conste deste ato o estabelecimento de regime de tributação em separado – Parágrafo Único do art. 12-. Consta do citado parágrafo 7º da INSRF 487 de 2.004:

§ 7º O valor do imposto retido na fonte a que se refere este artigo poderá ser:
I – deduzido do imposto sobre ganhos líquidos apurados no mês;
II – compensado com o imposto incidente sobre ganhos líquidos apurados nos meses subseqüentes;
III – compensado na declaração de ajuste anual se, após a dedução de que tratam os incisos I e II, houver saldo de imposto retido;
IV – compensado com o imposto devido sobre o ganho de capital na alienação de ações.

Por todo o exposto, queremos crer que a melhor interpretação destes dispositivos poderia ser assim explicitada:

ORDEM PERÍODO VALOR A REDUZIR
No mês Deduzido do imposto sobre Day Trade
No mês Compensado com o imposto sobre Renda Variável
No mês Compensado com o imposto devido sobre ganhos de capital na alienação de ações
No mês subseqüente Compensado com o imposto devido sobre Day Trade
No mês subseqüente Compensado com o imposto devido sobre Renda Variável
No mês subseqüente Compensado com o imposto devido sobre ganhos de capital na alienação de ações
No ano calendário Compensado na declaração de ajuste anual
No ano calendário Formalizar Pedido de Restituição porque o imposto pago, por antecipação, e não aproveitado, no mesmo ano, deve ser restituído como dedução da receita do mesmo exercício financeiro da União

 

Registre-se ainda que em caso de isenção do contribuinte pessoa física, o imposto de fonte será definitivo, não cabendo, portanto, compensação de qualquer espécie ou mesmo restituição – inciso II, do §11 do art. 31 da IN SRF nº 25 de 2.001-.

Prazo de recolhimento do imposto e respectivo código de receita

O imposto sobre os rendimentos auferidos em operações de Day Trade, auferidos por pessoas físicas residentes e domiciliados no País, será recolhido até o ultimo dia útil do mês seguinte ao do acontecimento do ganho.

O documento de arrecadação – DARF- será preenchido com o código de receita 6015 (Ganhos Líquidos em Operações em Bolsa) quando devido por pessoa física. As instituições financeiras usarão o código 8468 para indicar o imposto de fonte retido de pessoa física.

Embora o imposto sobre os rendimentos auferidos em operações de Day Trade seja recolhido juntamente com o imposto incidente sobre os Ganhos Líquidos em Renda Variável, deve-se atentar para o fato de que os cálculos serão sempre distintos, sendo os documentos e memórias de apuração, mantidos em poder do cidadão até que se extinga o prazo de lei para que as autoridades tributárias possam rever os atos praticados pelos contribuintes.

Isenção

Não se aplica aos rendimentos auferidos em Day Trade a isenção prevista no art. 3º da Lei nº 11.033 de 2.004, verbis:

Art. 3º Ficam isentos do imposto de renda:
I – os ganhos líquidos auferidos por pessoa física em operações no mercado à vista de ações nas bolsas de valores e em operações com ouro ativo financeiro cujo valor das alienações, realizadas em cada mês, seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), para o conjunto de ações e para o ouro ativo financeiro respectivamente;

- Publicado pela FISCOSoft em 11/12/2009

 

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

 

Equivalência Patrimonial 2009

Apesar das importantes alterações legais recentemente ocorridas na elaboração das demonstrações financeiras das sociedades anônimas (Leis 11.638 e 11.941), o instituto da Equivalência Patrimonial continua soberano quando se deva avaliar investimentos em participações societárias emitidas por empresas controladas, coligadas e por coligadas equiparadas (nova figura). Os conceitos e seus respectivos limites permanecem reservados à lei ordinária, mas, os detalhes procedimentais serão impostos por órgãos reguladores como pelo Conselho Monetário Nacional, através de seu braço executivo Banco Central do Brasil, e, pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM-.

A avaliação de investimentos pelo MEP – Método de Equivalência Patrimonial – deve ser observada desde o momento da aquisição do investimento, quando acontecerá a primeira avaliação e será determinado o Valor Patrimonial do Investimento adquirido. Para tanto o valor da contraprestação entregue no ato da aquisição é comparado ao Valor Patrimonial do Investimento sendo a diferença considerada ágio ou deságio na aquisição de investimentos. Esta primeira avaliação é a preocupação central deste trabalho, pois deste fenômeno surgem significativas conseqüências societárias e tributárias na vida das empresas.

DL nº 1.598 de 1.977

Em 1.976 foi introduzido em nosso Direito Comercial o instituto da Equivalência Patrimonial (Lei 6.404/76 art. 248). Trata-se de um método de avaliação de investimentos, sob a forma de participações societárias em sociedades coligadas e controladas, que difere do método corrente de representação de valor fundado no custo de aquisição. Desde então convivemos com estes dois métodos de avaliação de participações societárias em outras sociedades.

O MEP – método de equivalência patrimonial, como é conhecido-, segundo o disposto na Lei Comercial, consiste numa operação relativamente simples em que conhecido o percentual de participação, no capital social da investida, aplica-se, tal percentual, sobre o valor contábil do patrimônio líquido, sendo o resultado, o valor eqüitado do investimento. Note-se que a Lei impõe o valor de equivalência do investimento e não o valor de igualdade do investimento, porque, por vezes, é necessário se processar alguns ajustes não contábeis no valor declarado do patrimônio líquido da investida.

Em 1.977 foi editado o DL nº 1.598 que teve por escopo principal adaptar a Lei Tributária às novas disposições da Lei Comercial. Particularmente no caso da Equivalência Patrimonial, tal diploma legal veio a impor regras complementares ao artigo 248 da Lei nº 6.404/76 disciplinando, entre outros pontos, a primeira avaliação pelo MEP, a natureza da diferença entre o valor apurado pelo MEP e o preço de aquisição, bem como as conseqüências tributárias destes procedimentos. A matéria foi objeto dos artigos 20 a 26 do Decreto Lei.

Neste cenário surgiram as figuras do Ágio e do Deságio na aquisição de investimentos relevantes. O ágio ocorre quando o preço de aquisição for superior ao valor patrimonial do investimento e o deságio quando o preço de aquisição for inferior ao valor patrimonial do investimento. A determinação da ocorrência do ágio ou do deságio é imposta por Lei no momento da aquisição do investimento – DL nº 1.598/77 art. 20-. Nesta apuração os agentes econômicos deveriam ainda indicar os fundamentos econômicos que justificara o ágio ou o deságio apurado. Tais fundamentos econômicos foram categorizados em três espécies distintas – §2º do art. 20 do Decreto Lei – a saber:

a Avaliação a preços de mercado dos bens do ativo, contabilizados na investida, comparando estes preços de mercado com os valores registrados em sua contabilidade com exigência legal de documentação probatória;
b Rentabilidade futura da investida apoiada em previsão de resultados futuros, com exigência de documentação probatória;
c Fundo de comércio e outros intangíveis não contabilizados na investida bem como outras razões não classificadas nas letras “a” e “b”, sem exigência de documentação probatória.

 

Apurado o ágio ou o deságio na aquisição, o valor do investimento seria representado, no Balanço Patrimonial, pelo Valor Contábil formado pela soma algébrica do Valor Patrimonial mais o Ágio ou menos o Deságio conforme o caso, sendo a declinação do fundamento econômico apontada em Notas Explicativas.

Como se pode deduzir, as ocorrências, do ágio ou do deságio não tinham impacto imediato na base de cálculo do IRPJ ou mesmo da CSLL, depois de sua criação. Por princípio, estes valores eram agregados ao valor patrimonial do investimento para formar o valor contábil da riqueza até o desfazimento daquela aplicação de capital.

As amortizações contábeis (regras comerciais) eram neutras sobre o ponto de vista tributário. Somente por ocasião da apuração de ganho ou perda de capital naquela aplicação é que estes valores assumiam relevância tributária – DL nº 1.598/77 art.25 com redação dada pelo DL nº 1.730/79-.

Diga-se, de passagem, que o art. 34 do DL nº 1.598 impunha a apuração de ganho ou perda de capital, como se realização patrimonial fosse, em situação de ocorrência de substituição do investimento relevante por acervo líquido recebido da investida nos casos de fusão, incorporação e cisão de sociedades. Assim nas reorganizações societárias os valores do ágio e do deságio também assumiam relevância tributária podendo compor o ganho tributável ou a perda dedutível, em certas situações.

Lei nº 9.532 de 1.997

O art. 7º da Lei nº 9.532 de 1.997 derrogou as disposições do art. 34 do DL nº 1.598/77, passando a tratar a troca dos investimentos em sociedades coligadas e controladas por acervo líquido recebido destas investidas, em processos de fusão, cisão e incorporação, como mera substituição e não mais como realização de capital.

De outro lado e por razões de ordem macro econômicas, a mesma Lei, introduziu o incentivo fiscal à mobilidade de capital, visando, principalmente, atrair investidores para as privatizações. De sorte que o legislador ordinário se valeu da mesma engenharia para apuração do ágio e do deságio para dar eficácia ao incentivo fiscal estatuído. Surge então a possibilidade de amortização, com efeitos tributários, do ágio fundado em rentabilidade futura, conforme disciplinado na letra “b” do §2º do art. 20 do DL nº 1.598/77. Assim o ágio do investimento passou a ser registrado em conta do ativo permanente, sujeita à amortização que, para efeitos fiscais, ficou limitada a 1/60 por mês de cada período de apuração das bases de caçulo do IRPJ e da CSLL, nas ocorrências concretizadas de reorganizações societárias. Em outras palavras: o incentivo só pode ser aproveitado em processos de fusão, cisão ou incorporação com efetiva mobilidade de capital.

Frise-se a condição de renuncia fiscal tendo em vista que, por princípio, ágio é parte do preço de um investimento em capital social, não tendo, portanto, conotação de bem sujeito à amortização, exaustão ou depreciação.

Instituições Financeiras

Estamos vivendo profundas modificações de forma e conteúdo na elaboração de nossas demonstrações financeiras, visando aproximação aos grandes mercados internacionais. A harmonização de nossas regras de contabilidade ao padrão internacional já é uma realidade e vem sendo liderada pelo Poder Público e por órgãos técnicos da sociedade civil. Neste mister duas Leis já foram editadas: a Lei nº 11.638 de 2.007 e a Lei nº 11.941 de 2.009.

Na recém editada Lei nº 11.941 de 2.009 vamos encontrar uma verdadeira cláusula de exclusão das instituições financeiras e demais entidades que dependem de autorização do Banco Central do Brasil para o seu funcionamento, das regras impostas pela própria Lei quanto à escrituração comercial. A tal cláusula de exclusão está assim redigida:

“Art. 61. A escrituração de que trata o art. 177 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, quando realizada por instituições financeiras e demais entidades autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, inclusive as constituídas na forma de companhia aberta, deve observar as disposições da Lei no 4.595, de 31 de dezembro de 1964, e os atos normativos dela decorrentes”

Portanto as instituições financeiras seguirão, ainda, os atos normativos expedidos pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil na elaboração de suas demonstrações financeiras, ficando afastadas as determinações da Comissão de Valores Mobiliários – CVM – ainda que se trate de sociedade de capital aberto.

Tiveram repercussão no sistema legal monetário algumas modificações trazidas pela Lei nº 11.638, conforme fica assentado na Resolução CMN/BACEN nº 3.619 de 2.008 que passou a vigorar a partir de 1º de janeiro de 2.009, com o seguinte teor:

“Art. 1º As instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem avaliar pelo método da equivalência patrimonial os investimentos, no País e no exterior, em:
I – coligadas, quando participarem com 20% (vinte por cento) ou mais do capital votante ou detiverem influência significativa em sua administração;
II – sociedades controladas;
III – sociedades integrantes do conglomerado econômicofinanceiro;
IV – sociedades que estejam sob controle comum.
Art. 2º As instituições que detenham investimentos que, em face do disposto no art. 1º, não possam mais ser avaliados pelo método da equivalência patrimonial devem:
I – considerar o valor contábil do investimento na data-base 31 de dezembro de 2008, incluindo o ágio ou o deságio não amortizado, como novo valor de custo para fins de mensuração futura e de determinação do seu valor recuperável; e
II – contabilizar, em contrapartida desses investimentos, os dividendos recebidos por conta de lucros que já tiverem sido reconhecidos por equivalência patrimonial.
Art. 3º O Banco Central do Brasil disciplinará os procedimentos a serem observados na avaliação de investimentos de que trata esta resolução.
Art. 4º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos a partir de 1º de janeiro de 2009″

Releva-se o poder normativo do Banco Central do Brasil que na matéria manteve a mesma categorização dos fundamentos econômicos da apuração do ágio ou do deságio citada pelo DL nº 1.598/77 quando da aquisição de investimentos a serem avaliados pelo MEP. Neste sentido dispõe o Plano Contábil das Instituições Financeiras – COSIF -:

“15 – Para efeito de contabilização, a instituição deve: (Circ 1273)
a) desdobrar o custo de aquisição em:
I – valor do patrimônio líquido na época da aquisição;
II – ágio ou deságio na aquisição do investimento, que é a diferença entre o custo de aquisição e o valor patrimonial das ações;
b) indicar, no lançamento do ágio ou deságio, dentre os seguintes, o seu fundamento econômico, comprovado por documentação que sirva de base à escrituração:
I – valor de mercado de bens do ativo da coligada ou controlada superior ou inferior ao custo registrado na contabilidade;
II – valor de rentabilidade da coligada ou controlada, com base em previsão dos resultados futuros;
III – fundo de comércio, intangíveis e outras razões econômicas.”

De forma especial o Banco Central do Brasil impõe a seus administrados que no caso de ágio apurado com base em rentabilidade futura, a amortização do ágio se dará até o valor deste mesmo ágio, pela incorporação ao valor do investimento daquela parcela que corresponder a aumento do PL da avaliada por realização dos lucros antes previstos. Somente quando o ágio estiver totalmente amortizado e ainda houver lucro apurado na avaliada é que a contrapartida do ajuste no valor patrimonial investimento se dará em renda operacional. Assim enquanto houver ágio não há resultado de equivalência patrimonial. A regra está assim escrita:

17 – O ágio ou deságio contabilizado na investidora ou controladora, com fundamento na previsão de resultados futuros da coligada ou controlada, deve ser amortizado em consonância com os prazos de projeções que o justificaram ou, quando baixado o investimento, por alienação ou perda, antes de cumpridas as previsões. Observar, a respeito, o disposto no item 1.11.2.20.a. (Circ 1273)
20 – O valor de patrimônio líquido de investimento registrado na forma dos itens 1.11.2.15 a 1.11.2.18 deve ser ajustado, na investidora, com base no valor de patrimônio líquido da coligada ou da controlada. A diferença apurada registra-se, na investidora ou controladora, a débito ou a crédito da conta que registrar o investimento, e a contrapartida do ajuste é contabilizada: (Circ 1273; Res 3565 art. 1º)
a) como amortização do ágio, mediante incorporação ao investimento, quando o fundamento econômico for o de previsão de resultados de exercícios futuros, e até o valor destes, se corresponder a aumento do patrimônio líquido da coligada ou controlada, em decorrência de lucros nesta registrados;
b) como resultado do período, constituindo renda operacional, caso não haja mais ágio a amortizar nas condições da alínea anterior, se corresponder a lucros ou comprovadamente a ganhos efetivos apurados na coligada ou na controlada. Utiliza-se, nesta hipótese, a conta RENDAS DE AJUSTES EM INVESTIMENTOS EM COLIGADAS E CONTROLADAS;”

Assim fica claro que no caso de ágio pago com base em rentabilidade futura da investida, o resultado do MEP não afetará o lucro líquido do exercício e nem as bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, se não houver mobilidade de capital com extinção do investimento pelos institutos de reorganização societária.

Nova Disciplina dos Critérios de Avaliação em Operações Societárias

A Lei nº 11.941 de 2.009 adicionou o art. 184-A à Lei nº 6.404/76 com a seguinte redação:

” Art. 184-A. A Comissão de Valores Mobiliários estabelecerá, com base na competência conferida pelo § 3o do art. 177 desta Lei, normas especiais de avaliação e contabilização aplicáveis à aquisição de controle, participações societárias ou negócios”

O poder normativo da CVM foi extremamente ampliado para alcançar não só avaliação de participações societárias como aquisição de controle e outros negócios que devam ser avaliados pela função conjunta dos ativos e passivos. É neste universo que serão inseridas as novas regras do MEP para empresas não financeiras.

De perto nos interessa a primeira avaliação das participações societárias adquiridas que serão avaliadas pelo MEP. Para tanto transcrevemos a parte da Instrução CVM 247/96 (texto já atualizado) que versa sobre este tópico:

“DO ÁGIO OU DESÁGIO NA AQUISIÇÃO DE INVESTIMENTO AVALIADO PELO MÉTODO DA EQUIVALÊNCIA PATRIMONIAL
Art. 13. Para efeito de contabilização, o custo de aquisição de investimento em coligada e controlada deverá ser desdobrado e os valores resultantes desse desdobramento contabilizados em sub-contas separadas:
I – equivalência patrimonial baseada em demonstrações contábeis elaboradas nos termos do artigo 10; e II – ágio ou deságio na aquisição ou na subscrição, representado pela diferença para mais ou para menos, respectivamente, entre o custo de aquisição do investimento e a equivalência patrimonial.
Art. 14. O ágio ou deságio computado na ocasião da aquisição ou subscrição do investimento deverá ser contabilizado com indicação do fundamento econômico que o determinou.
§ 1º O ágio ou deságio decorrente da diferença entre o valor de mercado de parte ou de todos os bens do ativo da coligada e controlada e o respectivo valor contábil, deverá ser amortizado na proporção em que o ativo for sendo realizado na coligada e controlada, por depreciação, amortização, exaustão ou baixa em decorrência de alienação ou perecimento desses bens ou do investimento.
§ 2º O ágio ou o deságio decorrente da diferença entre o valor pago na aquisição do investimento e o valor de mercado dos ativos e passivos da coligada ou controlada, referido no parágrafo anterior, deverá ser amortizado da seguinte forma:
a) o ágio ou o deságio decorrente de expectativa de resultado futuro – no prazo, extensão e proporção dos resultados projetados, ou pela baixa por alienação ou perecimento do investimento, devendo os resultados projetados serem objeto de verificação anual, a fim de que sejam revisados os critérios utilizados para amortização ou registrada a baixa integral do ágio; e
b) o ágio decorrente da aquisição do direito de exploração, concessão ou permissão delegadas pelo Poder Público – no prazo estimado ou contratado de utilização, de vigência ou de perda de substância econômica, ou pela baixa por alienação ou perecimento do investimento.”

Revela o texto duas categorias de ágio apurado na aquisição de participações societárias que convivem com tres formas distintas de amortização comercial, a saber:

JUSTIFICATIVA ECONÔMICA DO ÁGIO PAGO AMORTIZAÇÃO COMERCIAL COMPULSÓRIA
a) diferença entre o valor de mercado de um ativo contabilizado na investida e seu valor de escrituração Na proporção em que o ativo for sendo realizado na investida ou pela baixa destes bens-
b) diferença entre o valor de mercado do patrimônio líquido da investida e seu valor escritural
Sub espécies de “b”
Rentabilidade futura ( goodwill) No prazo e proporção dos resultados projetados ou pela baixa do investimento, sendo obirgatória a revisão anual dos resultados projetados
Direitos de exploração, concessão ou permissões delegadas pelo Poder Público, não contabilizados na investida No prazo estimado ou contratado de utilização, de vigência ou de perda de substância econômica ou ainda pela baixa do investimento.

 

Demonstrações Financeiras Encerradas em 2008

Nesta fase de transição, as demonstrações financeiras encerradas em 2.008 foram elaboradas segundo a Orientação do Comitê de Pronunciamento Contábeis nº 02 que relembrou as regras de apuração do ágio e do deságio na aquisição de participações societárias constantes da Instrução CVM 247 de 1.996 e acrescentou:

Ágio por Expectativa de Rentabilidade Futura
“39. Esteve em audiência pública minuta do Pronunciamento Técnico CPC 15 – Combinação de Negócios, para normatizar a nova redação do artigo 226, par. 3o, da Lei das S/A, introduzida pela Lei no. 11.638/07. Ocorre que esse parágrafo foi alterado pela Medida Provisória no. 449/08, e a obrigação de que a fusão, cisão e incorporação entre partes independentes que se seguisse a uma transação de controle da entidade se fizesse com os ativos e passivos a valores justos foi eliminada.Ficou em seu lugar a determinação de que a CVM normatizasse a matéria. À vista dessa mudança, o citado Pronunciamento Técnico acabou não sendo formalmente emitido, ficando programada sua emissão durante 2009 com vigência a partir de 2010, para a plena convergência às normas do IASB.
40. A minuta desse Pronunciamento tratava com detalhe do cálculo do Ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) nos processos de combinação de negócios (não só compra de participação societária e também sem vínculo obrigatório a processos de fusão, cisão ou incorporação).
41. À vista da não emissão do Pronunciamento e de não emissão ainda, por parte da CVM, de qualquer ato regulando esse novo texto legal, surgiram dúvidas quanto à forma de apuração do citado ágio em 2008 e 2009, antes da emissão do novo documento sobre combinação de negócios.
(…)
45. Assim, a recomendação deste CPC é que, enquanto não emitido o Pronunciamento sobre Combinação de Negócios, os ativos e passivos da sociedade adquirida, ou os relativos à parte cindida, sejam avaliados a seus valores justos (de mercado), antes da mensuração do ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill). A parcela desses valores justos (de mercado) que exceder o valor contábil deve ser tratada como ágio decorrente de diferença entre valor de mercado e valor contábil e sofrer os processos de baixa conforme as baixas dos elementos que lhe deram origem. Exceção feita à previsão de reconhecimento separado de determinados ativos e passivos hoje normalmente não reconhecidos nesse processo, especialmente do ativo intangível adquirido em uma combinação de negócios a que se refere o item 34 do CPC 04 – Ativo Intangível, que pelo item 129 fica sem efeito até a emissão de Pronunciamento específico sobre combinação de negócios.
46. Dessa forma, a parcela que exceder os valores justos ou de mercado desses ativos deve ser tratada contabilmente como ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill).”

Esta orientação evidencia com clareza que ágio por expectativa de rentabilidade futura – goodwill- só pode surgir após a imperiosa apuração de ágio representado pela diferença entre o valor de mercado – valor justo – dos ativos contabilizados na investida e os respectivos valores contábeis destes mesmos ativos na investida.

Quanto à amortização do ágio fundado em retabilidade futura, a partir de 2.009, preconiza a referida orientação:

“48. (….). A partir do exercício social iniciado em ou a partir de 01 de janeiro de 2009, a amortização contábil sistemática do ágio por expectativa de rentabilidade futura (goodwill) cessa completamente, permanecendo apenas a aplicação do teste de recuperabilidade exigida pelo Pronunciamento Técnico CPC 01.
49. As amortizações fiscais, quando admitidas, se farão apenas via uso de livros fiscais auxiliares, com os reflexos contábeis relativos aos impostos diferidos (ativos ou passivos) que forem aplicáveis nas circunstâncias.
50. É importante lembrar que só pode ser reconhecido o ativo intangível ágio por expectativa de rentabilidade futura se adquirido de terceiros, nunca o gerado pela própria entidade (ou mesmo conjunto de empresas sob controle comum). E o adquirido de terceiros só pode ser reconhecido, no Brasil, pelo custo, vedada completamente sua reavaliação.”

Equivalência Patrimonial 2.009

Hoje já está aprovado o Pronunciamento CPC-15 que versa sobre Combinação de Negócios – aprovação pela Deliberação CVM nº 580 de 2.009 -. Deste documento serão extraídas as regras a serem observadas para determinação do valor específico do ágio pago ou do deságio auferido na aquisição de participações societárias sujeitas ao MEP. A CVM no exercício de seu poder regulamentar (Lei 6.404, art. 177 §§ 3º e 5º com redação dada pela Lei 11.638 de 2.007) não fez nenhuma distinção para os casos de aquisição de participações societárias a serem avaliadas pelo MEP que pudesse sugerir a incidência deste Procedimento no caso.

Segundo o que consta no CPC- 15, as apurações quantitativas serão processadas na ordem estabelecida, ou seja: o primeiro passo é se conhecer o quanto do ágio decorre da diferença entre o valor justo do bem ou direito avaliado a mercado e o seu valor contábil no ativo da investida; o segundo passo é se verificar se há ainda valor de ágio que excede à primeira apuração; se houver o valor será classificado como “goodwill” no ativo não circulante, subgrupo INVESTIMENTOS na escrituração da investidora, mas no Ativo Intangível em caso de demonstrações consolidadas. A parcela do ágio referente à primeira quantificação permanece classificada no subgrupo Investimentos do grupo do Ativo Não Circulante, sendo, todavia, agregado ao bem ou direito que lhe deu origem em caso de publicação de demonstrações financeiras consolidada.

Ocorrendo a incorporação do acervo líquido representado pelas participações societárias, extintas no momento da substituição, tanto o ágio categorizado como valor de mercado dos ativos como o de rentabilidade futura serão agregados as respectivas contas de origem. Assim se no momento da aquisição de participações societárias o ágio fundado em rentabilidade futura ter sido apurado com base na existência de um ativo intangível não contabilizado na investida, será ele quando ocorrer a incorporação objeto de classificação em conta própria, segundo o que estabelecido pela CVM na orientação OCPC nº 02 e vazado nos seguintes termos:

“56. Quando ocorre a incorporação do investimento que deu origem ao ágio, o ágio decorrente do diferencial do valor de mercado dos ativos e passivos passa a integrar as contas dos ativos ou passivos que lhe deram origem da mesma forma que nas demonstrações contábeis consolidadas e, se aplicável, são realizados da mesma forma que os ativos e passivos originais incorporados. Conseqüentemente, o ágio pago por expectativa de rentabilidade futura que remanescer é classificado no subgrupo Ativo Intangível”

RTT- Regime Tributário Transitório

Por se tratar de uma fase de transição, coube à ordem tributária a instituição de um regime transitório que foi denominado Regime Tributário Transitório e foi instituído pela Lei nº 11.941 de 2.009. Destaca-se deste regime transitório o que vem assentado no art. 16:

“Art. 16. As alterações introduzidas pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei que modifiquem o critério de reconhecimento de receitas, custos e despesas computadas na apuração do lucro líquido do exercício definido no art. 191 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, não terão efeitos para fins de apuração do lucro real da pessoa jurídica sujeita ao RTT, devendo ser considerados, para fins tributários, os métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007.
Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput deste artigo às normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, com base na competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e pelos demais órgãos reguladores que visem a alinhar a legislação específica com os padrões internacionais de contabilidade.

Queremos crer que este artigo 16 só tenha aplicação quando a situação fática envolver critério de reconhecimento de receita, custo ou despesa. O assunto aqui tratado versa sobre a primeira avaliação de investimento pelo MEP, no sentido de se quantificar os valores do ágio pago ou deságio auferido na aquisição de participações societárias. Apesar de os resultados da equivalência patrimonial, na seqüência da primeira avaliação serem considerados receita ou renda operacional, o citado dispositivo não se vincula à matéria por se tratarem de ajustes de avaliação de ativos que não foram modificados.

Maior dificuldade se apresenta na interpretação do disposto no art. 17 da Lei 11.941 de 2.009 que estatui:

“Art. 17. Na ocorrência de disposições da lei tributária que conduzam ou incentivem a utilização de métodos ou critérios contábeis diferentes daqueles determinados pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, com as alterações da Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e dos arts. 37 e 38 desta Lei, e pelas normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários com base na competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, e demais órgãos reguladores, a pessoa jurídica sujeita ao RTT deverá realizar o seguinte procedimento:
I – utilizar os métodos e critérios definidos pela Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, para apurar o resultado do exercício antes do Imposto sobre a Renda, referido no inciso V do caput do art. 187 dessa Lei, deduzido das participações de que trata o inciso VI do caput do mesmo artigo, com a adoção:
a) dos métodos e critérios introduzidos pela Lei nº 11.638, de 28 de dezembro de 2007, e pelos arts. 37 e 38 desta Lei; e
b) das determinações constantes das normas expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários, com base na competência conferida pelo § 3º do art. 177 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, no caso de companhias abertas e outras que optem pela sua observância;
II – realizar ajustes específicos ao lucro líquido do período, apurado nos termos do inciso I do caput deste artigo, no Livro de Apuração do Lucro Real, inclusive com observância do disposto no § 2o deste artigo, que revertam o efeito da utilização de métodos e critérios contábeis diferentes daqueles da legislação tributária, baseada nos critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, nos termos do art. 16 desta Lei; e
III – realizar os demais ajustes, no Livro de Apuração do Lucro Real, de adição, exclusão e compensação, prescritos ou autorizados pela legislação tributária, para apuração da base de cálculo do imposto. “

Há no “caput” do artigo uma exigência imposta ao operador do direito, qual seja: identificar uma disposição de lei tributária que só terá eficácia se utilizados certos métodos ou critérios contábeis diferentes daqueles impostos pelo Direito Privado. Lembramos, no caso, o exemplo do incentivo fiscal constante do art. 7º da Lei nº 9.532 que autoriza a dedutibilidade da amortização do ágio pago na aquisição de investimentos em razão da expectativa de rentabilidade futura. A lei tributária conduz a uma redução da base de cálculo dos tributos IRPJ e CSLL pela via da amortização que poderia ocorrer tanto na escrituração comercial como na escrituração fiscal. Como a Lei Comercial não permite este critério contábil resta ao agente econômico se valer dos ajustes previstos no inciso II do aventado art. 17.

Todavia é preciso lembrar que a determinação do valor do ágio não é matéria da Lei Tributária. A fase preliminar de apuração do valor é regida por normas expedidas pelos órgãos reguladores do mercado de capitais e do sistema financeiro e não pelo Direito Tributário. Assim sempre foi desde a edição do DL nº 1.598/77. Coube à Lei Tributária disciplinar o impacto deste fenômeno comercial nas bases de cálculos do IRPJ e da CSLL, mas, não identificar e quantificar o fenômeno.

Este comando legal do RTT terá lugar em situações de aquisição de participações societárias, avaliadas pelo MEP, quanto aos ajustes de compatibilização entre escrituração contábil e fiscal, mas não quanto ao valor apurado do ágio, por exemplo. Se as alterações da Lei comercial alteraram a quantificação e a categorização do ágio a partir de 2.009, será este valor e esta espécie de ágio que terá efeitos na Lei Tributária, segundo suas próprias regras.

Planejamento Tributário

Agora os, obrigatórios, Laudos de Avaliação a Mercado só poderão ser elaborados pelos peritos, ou por empresas especializadas, a partir da identificação dos justos valores dos ativos contabilizados pela investida; encerrada esta fase preliminar serão avaliados outros privilégios da investida. A conseqüência destas novas imposições presentes no CPC-15 farão com que parte do ágio pago na aquisição de investimentos relevantes seja consignada como Valor de Mercado de Ativos, reduzindo assim a parcela do “goodwill” objeto de incentivo fiscal, presente nas reorganizações societárias que se seguem à aquisição de investimentos avaliados pelo MEP. Não se trata mais de simplesmente declarar os fundamentos econômicos do ágio, na esfera tributária. Será preciso provar a seqüência lógica jurídica da apuração das espécies e dos valores, tendo em vista que o “goodwill” será sempre apurado por diferença. Ressalve-se as particularidades das instituições financeiras.

 

- Publicado pela FISCOSoft em 23/09/2009

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

Subvenção governamental para custeio presente no parcelamento de débitos tributários federais

A natureza e a forma da subvenção

A conversão da Medida Provisória nº 449 de 2.008 resultou na Lei nº 11.941 de 2.009, também chamada de REFIS DA CRISE, a qual, entre outras modificações normativas, alterou, substancialmente, a legislação federal sobre o parcelamento ordinário de débitos tributários controlados pela Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, alcançando créditos tributários constituídos, não constituídos, inscritos ou não em Divida Pública da União. O novo diploma ainda permitiu um segundo parcelamento de saldos devedores de antigos processos já formalizados.

Para incentivar a adesão dos contribuintes devedores, o Poder Público concedeu reduções das penalidades e dos juros moratórios, escalonadas em razão do prazo do pagamento; maior a redução quanto menor for o prazo de pagamento escolhido.

No presente trabalho, nosso esforço estará direcionado a conhecer a natureza jurídica do que foi estatuído nos §§ 7º e 8º do art. 1º da Lei em foco que vem assim assentado:

“§ 7o As empresas que optarem pelo pagamento ou parcelamento dos débitos nos termos deste artigo poderão liquidar os valores correspondentes a multa, de mora ou de ofício, e a juros moratórios, inclusive as relativas a débitos inscritos em dívida ativa, com a utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da contribuição social sobre o lucro líquido próprios.
§ 8o Na hipótese do § 7o deste artigo, o valor a ser utilizado será determinado mediante a aplicação sobre o montante do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa das alíquotas de 25% (vinte e cinco por cento) e 9% (nove por cento), respectivamente. “

A técnica jurídica da construção pode ser extraída do núcleo do texto legal, na inflexão do verbo poder – (…) poderão liquidar – revelando uma espécie de AUTORIZAÇÃO do ESTADO CREDOR direcionada ao CONTRIBUINTE DEVEDOR, presente no pólo passivo de uma relação processual. O contribuinte está autorizado a saldar parte de seu débito valendo-se de um valor apurado em sua escrituração fiscal- valores controlados no LALUR-.

A extinção de uma obrigação se faz com moeda corrente ou ativo equivalente. Existem outras formas de pagamento, como sabemos; a dação em pagamento, por exemplo. O que importa, na extinção de uma obrigação é que o credor satisfaça seu crédito mediante agregação, ao seu universo patrimonial, de riqueza transferida pelo do devedor, que sofre redução patrimonial equivalente. Portanto há um pressuposto fundamental na aplicação desta AUTORIZAÇÃO; o CONTRIBUINTE DEVEDOR deve ser titular de um direito patrimonial a ser transferido ao ESTADO CREDOR.

Não se conformam aos limites jurídicos de um direito patrimonial constituído, os valores referentes aos prejuízos fiscais acumulados e às bases de cálculo negativas da CSLL, controlados no Livro de Apuração do Lucro Real – LALUR PARTE B-. Estes valores consubstanciam-se em expectativas de direito porque seus proveitos econômicos dependem de eventos futuros e incertos. Portanto tais valores em si não são direitos patrimoniais constituídos que possam ser aproveitados para extinção de passivos tributários. È a Lei em comento que encerra a própria geração destes direitos patrimoniais. Cuida-se de uma geração de direitos do particular, por ficção jurídica, cujo conteúdo econômico se manifesta pela redução de parte do crédito constituído do Poder Público. Daí surge o caráter subvencional da autorização.

Esta subvenção não se destina à expansão de empreendimento econômico ou a investimento e, não pode ser confundida com doação, porque o contribuinte deverá abrir mão de futuros direitos. Portanto, se afasta, por completo, o que consta do art. 195-A da Lei 6.404/76 – Reserva de Incentivos Fiscais no Patrimônio Líquido-.

Sem afronta ao princípio da isonomia, a subvenção destina-se aos contribuintes devedores que aderiram à proposta de parcelamento de seus débitos. Caracteriza-se assim a figura da subvenção de custeio.

Contabilização

Não há duvida de que estamos frente a um caso exemplar de subvenção governamental não monetária. A subvenção se traduz num ativo não monetário- crédito fiscal- que será usado para quitar parte do passivo fiscal da entidade empresarial (redução de passivo).

Instaurado o processo de parcelamento deve o valor relativo à subvenção ser registrado em conta especifica do Ativo Circulante, restando saber qual será a contrapartida deste registro comercial.

Tendo em vista as disposições da Lei nº 11.638/2007 que outorgou poderes ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis para disciplinar a legislação contábil brasileira, recorremos ao disposto no CPC- 07 de onde extraímos fragmentos do Sumário de tal ato regulamentar que assim estabelece:

“Atenção especial é dada neste Pronunciamento ao momento do reconhecimento das subvenções governamentais. E a essência econômica da transação deverá ser sempre observada. As subvenções, mesmo as não monetárias, não devem ser reconhecidas até que exista segurança de que a entidade cumprirá todas as condições relacionadas à obtenção da subvenção e de que será efetivamente recebida. O simples recebimento de uma subvenção não é prova conclusiva de que as condições associadas à subvenção tenham sido ou serão cumpridas. E a forma como uma subvenção é recebida não influencia no método de contabilização a ser adotado. Assim, o reconhecimento da receita de subvenção governamental no momento de seu recebimento somente é admitido nos casos em que já cumpridas as condições necessárias à sua efetivação e em que não há bases de alocação da subvenção ao longo dos períodos beneficiados. Enquanto não atendidos os requisitos para reconhecimento no resultado, as contrapartidas das subvenções governamentais registradas no ativo serão em conta específica do passivo. No caso de subvenção na forma de ativo não monetário, a contrapartida poderá ser uma conta retificadora desse ativo.”

Do texto podemos inferir, de pronto, que a essência econômica prevalece sobre a forma jurídica. Portanto somente quando a entidade efetivamente auferir de forma definitiva os benefícios econômicos, haverá o reconhecimento da subvenção como receita da entidade, em conta de resultado. Enquanto isto não acontecer a entidade terá opção de abrir uma conta especifica no passivo ou abrir uma conta retificadora do ativo com saldo credor.

A rigorosa observância deste Pronunciamento se impõe pelo fato de a RFB e a PGFN terem poderes normativos na matéria- §3º do art. 1º da Lei nº 11.941 -. No âmbito destas atribuições, podem elas, em ato de revisão do procedimento, alterar, de ofício, os valores informados pelos contribuintes (art. 27 da Portaria Conjunta nº 06 de 2.009), reduzindo, assim, o valor efetivo da subvenção.

Temos fortes motivos para acreditar que tais reduções de ofício acontecerão em larga escala. A razão desta crença está no fato de que os valores controlados, pela RFB, no SISTEMA DE ACOMPANHAMENTO DO PREJUÍZO FISCAL E DO LUCRO INFLACIONÁRIO (SAPLI) não coincidem com os valores constantes da escrita fiscal dos contribuintes. As divergências surgem quando a entidade empresarial sofre um Auto de Infração que resulta em Redução de Prejuízo Fiscal e de Base de Cálculo Negativa da CSLL; impugnado o lançamento de ofício a entidade não promove as reduções apontadas nos Autos de Infração, enquanto, na repartição pública, o SAPLI é sensibilizado pelo agente tributário. Assim o mesmo fato jurídico passa a ser representado por dois valores até a solução final do processo administrativo ou judicial.

Subvenção isenta de tributação

A condição, imposta na Lei, de aprovação pelas autoridades tributárias não impede, entretanto, as ocorrências dos fatos geradores do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS no momento da formalização do pedido de parcelamento. A formalização do Pedido de Parcelamento revela uma situação jurídica de ocorrência de ato firmado sob condição resolutória por que a Lei estabeleceu a renuncia fiscal de forma objetiva – preenchidas as condições iniciais, o contribuinte ingressa no gozo do benefício sendo os pagamentos parciais o implemento da condição resolutória-.

A geração ficta de um crédito tributário também não se confunde com a formação de uma Provisão Ativa que é registrada no Ativo Circulante tendo por contrapartida conta de resultado com lançamento a crédito. Em verdade a subvenção materializa um ganho refletido pela redução do passivo tributário da entidade.

Isto posto temos que os contribuintes estariam obrigados a tributar o valor da subvenção no momento da formalização do Pedido de Parcelamento, caso não houvessem as isenções expressas na própria norma que concedeu a subvenção – Lei nº 11.941/2009-, verbis:

Art. 4º ((…)) . Parágrafo único. Não será computada na apuração da base de cálculo do Imposto de Renda, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS a parcela equivalente à redução do valor das multas, juros e encargo legal em decorrência do disposto nos arts. 1º, 2º e 3º desta Lei.

Destaca-se que as expressas citações de isenção confirmam a natureza da subvenção de custeio e seu atributo jurídico de ganho. Não fosse o caso, o legislador ordinário não seria compelido a se manifestar por escrito.

De outro lado, as diferenças de tratamento contábil e tributário não podem confundir o leitor. Para efeitos tributários há ocorrência de um ganho isento, enquanto que na disciplina contábil há registro especial de um ativo não monetário com origem em receita, a ser reconhecida de pronto ou no futuro.

Influenciarão no reconhecimento contábil da receita os valores envolvidos e o prazo revisional afeto às autoridades. A receita será reconhecida quando ficar afastada qualquer possibilidade de restabelecimento da dívida, o que poderá acontecer somente ao final do parcelamento.

Antecipação espontânea da receita contábil

È de se registrar ainda que o fato de a receita desta subvenção estar isenta das quatro exações citadas, não significa que haverá tolerância das autoridades tributárias quanto à antecipação espontânea do ganho. Não podemos deixar de advertir que antecipação contábil do ganho implica majoração dos saldos do Patrimônio Líquido e dos limites de cálculo dos JSCP do exercício seguinte.
- Publicado pela FISCOSoft em 21/09/2009

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

Fundo de comércio adquirido na combinação de negócios (goodwill)

Introdução

Dois empresários se encontram e um deles pergunta: Então, soube que você vendeu a empresa X; o ágio foi compensador? Responde o indagado: foi muito compensador.

Neste diálogo se pode perceber que a terminologia ágio está sendo empregada para indicar à diferença entre o valor contábil da empresa (valor contábil do patrimônio líquido) e o valor da transferência do controle societário da entidade negociada. O comprador e o vendedor usaram a terminologia ágio em sua acepção leiga, sem se preocuparem com a significância jurídica do termo ágio.

Agora surge entre nós uma nova figura jurídica que recebeu a denominação de ATIVO INTANGÍVEL – Lei nº 11.638 de 28 de dezembro de 2.007, art. 1º que alterou a redação do art. 179 da Lei nº 6.404/76-. Segundo a modificação de ordem legal, têm-se que o novo grupo contábil de contas deverá reunir “os direitos que tenham por objeto bens incorpóreos destinados à manutenção da companhia ou exercidos com essa finalidade, inclusive o fundo de comércio adquirido.”

Expressamente a lei ordenou a inclusão do “Fundo de Comércio Adquirido” no grupo de contas que irá abrigar os ativos intangíveis – direitos adquiridos passíveis de serem identificados, mensurados, reconhecidos, alienados ou ajustados contabilmente pelo impairment test-. Entretanto, foi silente quanto à hipótese de ocorrência fática do fenômeno jurígeno.

De pronto, não se sabe se o legislador estaria se manifestando no sentido de que toda a diferença, a maior, paga pelo adquirente ao vendedor, em relação aos ativos líquidos transferidos a valor de mercado (justo valor), seria considerada “fundo de comércio adquirido”, ou, se a expressão, posta na Lei, se refere à ocorrência de o “fundo de comércio” ser um item individuado, reconhecido e mensurado no ato da combinação do negócio. A dúvida é pertinente porque a Lei poderia mencionar apenas “Fundo de Comércio” como instituto legal comercial. Mas não é o caso porque a referencia legal se faz em razão do fundo de comércio surgido nas transações de aquisição de negócios. Como estamos frente a um arcabouço normativo contábil, pensamos que é nesta disciplina que devamos buscar a resposta e, não outra disciplina comercial.

Assim no tema é relevante que se observa as disposições de órgãos com poderes normativos, como é o caso do Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC- brasileiro.

CPC – Pronunciamento 15

1. O Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC – emitiu o Pronunciamento CPC 15 visando correlacionar as normas contábeis brasileiras às normas internacionais de contabilidade – IFRS 3- que versam sobre a combinação de negócios e a apuração do valor do ágio por rentabilidade futura (goodwill). Este Pronunciamento se inicia pela citação de princípios orientadores para os adquirentes de negócios, dos quais extrai-se as seguintes deduções:

a) todos os ativos, passíveis de identificação, devem ser reconhecidos na escrituração do adquirente mesmo que não estejam reconhecidos na escrituração da adquirida pelo seu justo valor (valor de mercado);

b) o valor relativo da participação dos não controladores no negócio que está sendo adquirido, deve ser considerado; alternativamente pode ser reconhecido pelo justo valor quando houver mercado ativo para os títulos;

c) o valor relativo ou absoluto da participação do próprio adquirente, no negócio que está sendo adquirido, deve ser considerado, também;

d) os bens e direitos adquiridos a mercado, líquidos dos passivos assumidos, serão reconhecidos como ativos líquidos mensurados a valores justos;

e) os ativos líquidos adquiridos serão reduzidos dos valores referentes às participações dos minoritários e às participações do próprio adquirente, existentes antes da conclusão do contrato, sendo o resultado final a base de comparação com a contraprestação entregue aos controladores do negócio que está sendo adquirido;

f) quando a contraprestação (PREÇO DO NEGÓCIO) for superior aos ativos líquidos ajustados estar-se-á na ocorrência de ágio por rentabilidade futura – goodwill -;

g) quando a contraprestação for inferior aos ativos líquidos ajustados estar-se-á frente á situação de ocorrência de GANHO APURADO EM COMPRA VANTAJOSA (antigo deságio) cujo resultado será computado na determinação do resultado da adquirente no período da concretização do contrato.

2. Vejamos exemplos numéricos:

Situação de goodwill

DISCRIMINAÇÃO DE PARCELAS VALOR EM R$
(+) P. L. a valores de mercado (valor justo e contábil) 10.000.000,00
(+) Ativos não registrados na adquirida 3.000.000,00
(-) Passivos não registrados na adquirida 1.000.000,00
(-) % dos minoritários nos Ativos Líquidos (25%) 2.500.000,00
(-) Participação Relativa Reflexa (5%) 500.000,00
(=) ATIVOS LÍQUIDOS AJUSTADOS 9.000.000,00
(-) VALOR DA AQUISIÇÃO DO NEGÓCIO 13.000.000,00
(+) GANHO NA COMPRA VANTAJOSA 0,00
(-) GOODWILL – AGIO PAGO POR RENTAB. FUTURA 4.000.000,00
LANÇAMENTOS CONTÁBEIS
D- CIRCULANTE LÍQUIDO 10.000.000,00
D- ATIVO INTANGIVEL RECONHECIDO 3.000.000,00
D- ATIVO INTANGIVEL= GOODWILL 4.000.000,00
SOMA DOS DÉBITOS 17.000.000,00
C- PASSIVO CONTINGENTE RECONHECIDO 1.000.000,00
C- PARTICIPAÇÃO EM COLIGADA (AGORA HÁ CONTROLE) 500.000,00
C- AJUSTE POR PARTICIPAÇÃO DOS MINORITÁRIOS- PL CONSOLIDADO 2.500.000,00
C- CAIXA OU CAPITAL SE HOUVE EMISSÃO DE AÇÕES 13.000.000,00
SOMA DOS CRÉDITOS 17.000.000,00

 

Situação de ganho por compra vantajosa

DISCRIMINAÇÃO DE PARCELAS VALOR EM R$
(+)P. L. a valores de mercado (valor justo e contábil) 10.000.000,00
(+) Ativos não registrados na adquirida 3.000.000,00
(-) Passivos não registrados na adquirida 1.000.000,00
(-) % dos minoritários nos Ativos Líquidos (25%) 2.500.000,00
(-) Participação Relativa Reflexa (5%) 500.000,00
(=) ATIVOS LÍQUIDOS AJUSTADOS 9.000.000,00
(-) VALOR DA AQUISIÇÃO DO NEGÓCIO 7.000.000,00
(+) GANHO NA COMPRA VANTAJOSA 2.000.000,00
(-) GOODWILL – AGIO PAGO POR RENTAB. FUT. 0,00
*: para efeitos didáticos há coincidência entre valores justos e contábeis
LANÇAMENTOS CONTÁBEIS
D- CIRCULANTE LÍQUIDO 10.000.000,00
D- ATIVO INTANGIVEL RECONHECIDO 3.000.000,00
SOMA DOS DÉBITOS 13.000.000,00
C- PASSIVO CONTINGENTE RECONHECIDO 1.000.000,00
C- PARTICIPAÇÃO EM COLIGADA (AGORA HÁ CONTROLE) 500.000,00
C- AJUSTE POR PARTICIPAÇÃO DOS MINORITÁRIOS- PL CONSOLIDADO 2.500.000,00
C- CAIXA OU CAPITAL SE HOUVE EMISSÃO DE AÇÕES 7.000.000,00
C- GANHO COMPRA VANTAJOSA CONTA DE RESULTADO 2.000.000,00
SOMA DOS CRÉDITOS 13.000.000,00

 

Ativos intangíveis identificáveis – CPC 04

3. Os ativos identificáveis devem resultar da aplicação dos critérios da “separabilidade” ou do contratual-legal. Por critério da “separabilidade” deve-se entender a possibilidade da individuação e alienação, no mercado, do ativo identificado. Já a aplicação do critério contratual-legal segue o princípio da prova documental, exigindo-se também, a possibilidade de alienação do direito adquirido ou seu destaque de outros ativos gerados ou mantidos pela entidade (vide fls.201, Manual de Normas Internacionais de Contabilidade, Ernst & Young e Fipecafi, S.Paulo 2.009, Editora Atlas, 1. Ed.). O Comitê de Pronunciamentos Contábeis – CPC – emitiu o Pronunciamento 04 sendo que do Sumário deste documento podemos ver assentado no item 4, a seguinte síntese:

“Um ativo é identificável na definição de um ativo intangível quando:
(a) for separável, isto é, capaz de ser separado ou dividido da entidade e vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, seja individualmente ou em conjunto com um contrato, ativo ou passivo relacionado; ou (b) resultar de direitos contratuais ou de outros direitos legais, quer esses direitos sejam transferíveis quer sejam separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações.”

4. Em se tratando de aquisição de um intangível em combinação de negócios destaca-se trechos do Pronunciamento 04:

35. Se um ativo intangível adquirido em uma combinação de negócios for separável ou resultar de direitos contratuais ou outros direitos legais, considera-se que o seu valor justo pode ser mensurado com segurança. (…)
36. Um ativo intangível adquirido em uma combinação de negócios pode ser separável, em determinadas circunstâncias, apenas conjuntamente com os ativos tangíveis ou intangíveis relacionados. Por exemplo, o título de uma revista pode não ser negociável separadamente da base de dados de assinantes ou uma marca de água mineral de determinada fonte não pode ser vendida sem a própria fonte. Nesses casos em que o valor justo individual de cada ativo do grupo não puder ser medido com segurança, o adquirente deve reconhecer um grupo de ativos como um único ativo separadamente do ágio derivado da expectativa de rentabilidade futura (goodwill).

5. Releve-se no ponto que o ato regulamentar impõe a segregação do intangível identificável do ágio derivado da expectativa da rentabilidade futura ( goodwill), mas não emprega, para tanto, a expressão “fundo de comércio adquirido” como consta da Lei. Podemos nos guiar por exemplos para ter a inteligência da regra. Comerciante que paga luvas contratuais (pagamento do ponto comercial), quando da assinatura de contrato de aluguel em shopping centre, ou, Banco que paga, também, luvas contratuais para alugar um imóvel destinado à instalação de uma nova agência, está adquirindo direitos contratuais identificáveis, passíveis de serem mensurados, sem natureza monetária e sem substância física e, ainda, que contribuirão para geração de caixa futuro. Presentes, assim, todos os requisitos para identificação e reconhecimento contábil dos citados ativos, seus valores não serão considerados “goodwill” para fins contábeis ainda que se trate de espécies de ativos do gênero fundo de comércio.

6. Entre tantas definições de Fundo de Comércio Empresarial podemos afirmar que a expressão indica o valor econômico da empresa que supera a totalidade do valor de mercado de seus ativos líquidos contabilizados, ou seja, o montante que supera o patrimônio líquido a valor de mercado. Seriam os privilégios relativos da empresa como, localização, marca, clientela (market-share), licenças, benefícios fiscais e outras vantagens comparativas capazes de influir no valor de uma negociação da entidade como um todo. São verdadeiras reservas ocultas de uma empresa que só se fazem presentes em negócios não correntes.

7. Assim também se define a expressão de língua inglesa “goodwill”. Vejamos uma citação constante da revista especializada IOB:

1.1 – O que é o Fundo de Comércio? “Fundo de Comércio é o que uma empresa tem de valor acima do seu patrimônio líquido avaliado a preço de mercado. (..) Representa, então, o “goodwill”, o que um Patrimônio Liquido consegue ter de valor, se negociada a empresa como um todo, acima do que seria obtido com a negociação de cada Ativo, individualmente, a preços de mercado.” (Boletim IOB nº15/85)

8. Portanto a expressão da Lei “fundo de comércio adquirido” está vinculada diretamente a situação de ocorrência de ágio pago por expectativa de rentabilidade futura(goodwill), sendo a diferença de designação meramente semântica.

9. Isto não quer dizer que na combinação de negócios seja impossível a identificação e a separação do ativo intangível “Fundo de Comércio”. Preferencialmente este ativo deverá ser sempre representando por uma nomenclatura mais específica como, por exemplo, “Carteira de Clientes” ao invés de Fundo de Comércio.

10. Em verdade, espera-se que os agentes econômicos usem a expressão Ágio Pago por Expectativa de Rentabilidade Futura para cumprir o que indicado na Lei nº 11.638/2007 como fundo de comercio adquirido. Isto é, quando for necessário denominar o valor que decorrer de uma operação aritmética indicativa de que o valor pago, para assumir o controle do negócio, superou todos os ativos líquidos adquiridos (incluídos aí os intangíveis identificados). A determinação do valor justo dos ativos e passivos assumidos será sempre um procedimento preliminar necessário.

Combinações de entidades sob controle comum

11. Todo o exposto no CPC-15 não se aplica aos casos de “joint venture” (novos negócios formados e controlados conjuntamente); compra de ativos ainda que em conjunto (no caso em que estes ativos não representem um negócio) e ainda no caso de combinação de negócios realizados dentro um mesmo grupo econômico ou financeiro (empresas sob controle comum).

12. As inúmeras operações realizadas entre investidas e investidoras, coligadas e controladas, ainda dependem de regulamentação internacional. Há um pressuposto dos envolvidos no tema de que tais operações far-se-ão por valores contábeis.

Aspéctos tributários

13. Estamos em plena vigência da faculdade legal instituída pela Lei nº 11.941/2009, em que os contribuintes podem optar, para os anos calendários 2.008 e 2.009, pela tributação fundada na legislação do IRPJ e da CSLL vigentes até 31 de dezembro de 2.007. Para esta transição foi instituído o Livro Auxiliar especifico denominado Controle Fiscal de Transição – Fcont -, onde serão formalizados e armazenados todos os ajustes decorrentes das diferenças existentes entre o novo padrão de escrituração contábil e a legislação tributária vigente. Finda-se este regime de transição quando o Poder Público disciplinar tributariamente os novos procedimentos contábeis, assim como o fez, quando da edição do DL nº 1.598/77, para disciplinar os efeitos da aplicação comercial da Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades por Ações).

14. “O RTT vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária” (§1º do art. 15 da MP nº 449/2008). Este texto legal tem natureza jurídica de dificil identificação. Mais parece uma norma social que expõe um compromisso político de que as normas de convergência contábil não irão alterar o ônus tributário dos contribuintes. Mas como inserta em diploma legislativo, com força vinculante e pressuposto de legalidade, devemos tomar o assentado como regra declaratória.

15. Apesar do que posto em Lei, não se pode olvidar que as situações concretas de combinação de negócios irão revelar elementos ou circunstâncias que antes ficavam camuflados nas peças formais e contábeis até então exigidas. Os negócios, realizados até então, eram guiados pelo princípio da estrita legalidade; o conteúdo econômico dos contratos permanecia blindado, e, os operadores do direito, não raro, ficavam a mercê de vulneráveis soluções jurídicas. O resultado disso, é que muitos ativos intangíveis identificáveis economicamente foram adquiridos, em combinação de negócios, mas foram reconhecidos sob a denominação de ágio por rentabilidade futura, objeto de incentivo fiscal até nossos dias.

16. Descortina-se agora uma nova fase de interpretação jurídica da combinação de negócios. As operações estarão instruídas por documentos reveladores do conteúdo econômico que poderão ser contestados em termos relativos ou absolutos. A obrigatória declinação do adquirente e a determinação do preço da operação – contraprestação transferida a valor justo – com o sentido de ocorrência de uma verdadeira troca comutativa, já serão suficientes para verificação do correto surgimento do fundo de comércio adquirido. Não se trata de sobrepor a interpretação econômica dos fatos ao princípio da estrita legalidade. Trata-se de colher no mundo das coisas, os sinais reveladores da capacidade contributiva dos contribuintes. E para tanto valem as demonstrações financeiras.

17. Em suma:

a) toda a dificuldade residirá no exercício de identificação dos ativos intangíveis envolvidos na troca de riquezas;

b) o fundo de comércio adquirido será apurado por diferença sendo, a única hipótese de existência de ágio no negócio;

c) o “goodwill” não poderá ser amortizado e será classificado no Ativo Intangível não mais compondo valor contábil do investimento.

- Publicado pela FISCOSoft em 09/09/2009

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

O Fundo de Comércio no Contexto do Regime Tributário Instituído pelos Arts. 7º e 8º da Lei nº 9.532/97

1. À par das divergências doutrinárias que possam existir sobre o conceito de “fundo de comércio”, esse intangível merece comentários especiais no universo delimitado pelos artigos 7º e 8º da Lei 9.532/97 que redefiniu o regime tributário da extinção de participações societárias, em razão de cisão, fusão e incorporação de sociedades.

2. Convém antes lembrar que o “fundo de comércio”, como uma universalidade jurídica, pode estar representado ou não nas demonstrações financeiras de uma pessoa jurídica. Quando ele não está representado graficamente no balanço patrimonial, sob a ótica contábil, esse patrimônio oculto constituí-se em uma RESERVA OCULTA. O seu reconhecimento em patrimônio jurídico-contábil implica em reconhecimento de receita sujeita à tributação pelo Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas e pela Contribuição Social sobre o lucro Líquido. Por isso não é comum o reconhecimento contábil desse ativo.

3. O fato de não ser comum o registro patrimonial do “fundo de comércio” não implica dizer que essa riqueza estará sempre fora das demonstrações financeiras. Certas situações e contratos privados tornam esse registro obrigatório, como é o caso, por exemplo, dos contratos de adesão/locação firmados entre os empreendedores e os varejistas dos centros comerciais (shopping-centers). Nesses contratos os varejistas pagam um determinado valor a título de RESERVA OU GARANTIA para uso do estabelecimento comercial. Esse direito, que inclusive pode ser transferido a terceiro, mediante contrato de cessão de direitos, poderá estar registrado na escrituração comercial como “fundo de comércio”. Outros negócios particulares, tais como pagamento de luvas em contratos de locação comercial, pagamento de ponto comercial, compra de clientela e assim por diante, poderão ensejar o registro contábil do “fundo de comércio”

4. Assim o registro contábil do “fundo de comércio” pode derivar do auto reconhecimento contábil de uma reserva oculta ou pode ser conseqüência da realização de um negócio jurídico particular.

5. Quando efetivado o registro contábil, para os efeitos do disposto nos arts. 7º e 8º da Lei nº 9.532/97, o “fundo de comércio” assumirá a mesma relevância jurídica que outros direitos intangíveis registrados no ativo da pessoa jurídica.

6. Determina o inciso II do art. 7º da Lei nº 9532/97 que, em havendo extinção de participações societárias adquiridas com ÁGIO, cujo fundamento econômico tenha sido mais valia no “fundo de comércio” da investida, por ocasião da substituição das participações societárias pela absorção de bens e direitos incorporados, seja essa parcela do ágio transferida da conta de investimentos para conta do ativo permanente não sujeita à amortização, devendo aí permanecer até a ocorrência de uma eventual alienação do direito que lhe deu causa, devolução de capital ao sócio ou encerramento de atividades.

7. Essa determinação, queremos crer, só pode alcançar aquelas situações em que o “fundo de comércio” não estava registrado no patrimônio da investida por ocasião da aquisição dos investimentos e nem teria sido reconhecido contabilmente pela coligada/controlada durante a constância da propriedade daquelas participações pela investidora. Tanto é verdade que o legislador nem sequer cuidou da hipótese da existência de DESÁGIO, pois seria impossível no mundo real das coisas.

8. A contrário senso, caso ocorresse aquisição de participações societária de uma investida que houvesse registrado em seu ativo o “fundo de comércio”, aí sim seria possível a apuração de ágio ou deságio na aquisição do investimento. Situação essa, então, que nos remeteria para as disposições legais constantes do inciso I do art. 7º da Lei nº 9.532/97 que cuida de ÁGIO ou DESÁGIO formados com fundamento no valor de mercado de bens ou direitos.

9. Nos parece então que essa é a melhor interpretação quando estivermos diante da questão do “fundo de comércio”.

- Publicado pela FISCOSoft em 14/09/1999

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato