O Princípio da Praticabilidade e a Ficção Jurídica no Comércio de Veículos Automotores Usados.

Hodiernamente muito se fala sobre a simplificação do sistema tributário brasileiro. Os leigos não diretamente interessados e a imprensa em geral parecem não observar os passos dados nesse sentido. Ganham destaque apenas os grandes temas como é o caso do SIMPLES- regime de tributação simplificada das pequenas empresas -. No entanto outros setores, com características econômicas próprias, vêm sendo excluídos do regime geral por atos legais específicos como é o caso do comércio varejista de veículos usados, objeto desse texto.

O PRINCÍPIO DA PRATICABILIDADE NA TRIBUTAÇÃO

O princípio da praticabilidade não é um princípio escrito mas difuso em nosso ordenamento. Na doutrina pátria MISABEL ABREU MACHADO DERZI, ilustre jurista, entre outras lições, ensina que no direito tributário o princípio da praticabilidade está associado à necessidade de se atribuir eficácia à norma jurídica diante dos parcos recursos da administração para enfrentar procedimentos detalhistas.

Entre as técnicas que materializam esse princípio estão as presunções e as ficcões.

A FICÇÃO JURÍDICA

Em breves palavras pode-se conceituar ficção jurídica como sendo um recurso técnico admitido no direito tributário com o qual, o legislador diante de realidades sabidamente distintas as equipara por norma jurídica específica que pode ser remissiva ou restritiva. Restritiva quando restringe alguém ou alguma coisa dos efeitos da norma geral; remissiva quando estende o alcance dos efeitos de um instituto à outra situação distinta.

O emprego das ficções jurídicas está condicionado a todos os princípios gerais norteadores da tributação.

CONTRATO ESTIMATÓRIO OU VENDA EM CONSIGNAÇÃO

O contrato estimatório ou venda em consignação é o negócio jurídico em que o consignatário recebe do consignante bens móveis, ficando autorizado a vendê-los e obrigando-se a pagar um preço estimado previamente, se não os restituir dentro do prazo ajustado. Portanto esse contrato difere do contrato de compra e venda mercantil eis que a tradição da coisa não implica em transferência de propriedade. Ademais no momento da consignação ou da entrega da coisa não há movimentação financeira ou alteração do estado patrimonial dos contratantes.

Os comerciantes de veículos usados praticam com muita frequência a consignação e, até aí, nenhuma restrição a tal conduta. Contudo a prática da cessão de espaço para que terceiro exponham seus carros até o momento da efetiva venda, mediante remuneração calculada em função de percentual do preço (fazer um H na gíria dos comerciantes),nada tem a ver com o contrato de consignação.

A EQUIPARAÇÃO DA COMPRA E VENDA À CONSIGNAÇÃO PARA FINS TRIBUTÁRIOS NO ÂMBITO DA UNIÃO FEDERAL

O art. 5º e seu parágrafo único da Lei nº 9.716 de 26 de novembro de 1.998 é base legal que, por ficção jurídica, equiparou os contratos de compra e venda mercantil de veículos usados ao de consignação quando praticados por pessoas jurídicas que tenham, formalmente, declarado, esse objeto social, em seus atos constitutivos. Com amparo nessa norma legal o Secretário da Receita Federal editou em 16 de dezembro de 1.998 a Instrução Normativa SRF nº 152.

O ALCANCE DA EQUIPARAÇÃO

É de todo conveniente tentarmos detalhar o alcance dessa equiparação que tem destinatário específico e operações formalmente documentadas como objeto. As ficções jurídicas não permitem interpretações extensivas o que, por sua vez, não implica dizer que a interpretação da lei que estabeleceu a equiparação deva ser absolutamente literal.

Destinatários da norma

No que concerne à atividade econômica, os destinatários da norma são aquelas pessoas jurídicas que tenham como objeto social declarado em seus atos constitutivos a compra e venda de veículos automotores . Esse requisito é essencial mas não suficiente a tornar a pessoa jurídica apta a empregar a equiparação. Ainda será necessário a comprovação de sua atividade nesse mercado, seja através, da origem de suas receitas ,de suas instalações, de seus estoques ou de outros meios admitidos em direito. Seria inadmissível que uma pessoa jurídica dedicada à atividade agrícola e, para tanto, estruturada no mesmo sentido, pretendesse usar dessa faculdade legal, na compra e venda de um trator usado, só porque em seus estatutos sociais constasse também a compra e venda de veículos automotores como objeto social. A norma não pode ser subvertida por meras questões semânticas.

Operações passíveis de equiparação

As operações passíveis de equiparação são aquelas que tem por objeto as vendas de veículos automotores usados que foram adquiridos com essa finalidade. Assim as compras de veículos novos, ainda que para revenda, estão fora do alcance da equiparação. A equiparação também não alcança a revenda de veículos antes usados pela própria pessoa jurídica em suas atividades, classificáveis no ativo imobilizado quando for o caso.

Os revendedores de veículos novos somente poderão usar dessa equiparação em relação aos veículos usados adquiridos ou aceitos como parte do preço de veículos novos.

A expressão veículos automotores, usada pelo legislador, indica o gênero do qual são espécies os automóveis, os caminhões, as motocicletas, os ônibus, as aeronaves e as embarcações destinada ao transporte de pessoas ou de cargas.

Quanto aos equipamentos de movimentação de cargas, mesmo que automotorizados, tais como as empilhadeiras, entendemos que, nesse contexto jurídico, não se ajustam ao conceito de veículo.

Vínculo ao Regime Tributário

Poderão aplicar essa equiparação as pessoas jurídicas sujeitas à tributação do imposto de renda com base no lucro real, presumido ou arbitrado (auto-arbitramento). Estão excluídas da norma as pessoas jurídicas optantes pelo SIMPLES. Portanto o regime tributário adotado pelo contribuinte também é fator condicionante ao uso da faculdade legal.

Obrigações Acessórias

Nas aquisições de veículos automotores usados junto a pessoas físicas ou jurídicas desobrigadas de emissão de nota fiscal, o comerciante haverá de emitir nota fiscal de entrada e, quando o mesmo objeto for revendido a competente nota fiscal de saída. Esses dois documentos fiscais deverão ainda ser inseridos nos demonstrativos especiais que a lei exige. A Secretaria da Receita Federal não impôs a forma desse demonstrativo, nem exigiu registros especiais do mesmo. Entretanto tal demonstrativo constituir-se-á em prova pré- constituída da efetiva ocorrência da compra e venda de um objeto específico, ou seja, o veículo que entrou é o mesmo que saiu eis que, veículos automotores são bens móveis não fungíveis. Portanto tal demonstrativo em nada se assemelha a inventários de quantidade ou de estoques.

O demonstrativo especial deverá ainda retratar com fidelidade a apuração da base de cálculo, apurada mensalmente, dos tributos e contribuições federais.

A FORMAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DOS TRIBUTOS E CONTRIBUIÇÕES ADMINISTRADOS PELA RECEITA FEDERAL

A base de cálculo será a diferença entre a somatória mensal dos preços de alienação constantes das notas fiscais de venda e a somatória mensal dos preços de aquisição constantes das notas fiscais de entrada. Determinada essa base ,a mesma servirá para cálculo

a- da contribuição para o financiamento da seguridade social -COFINS e

b- da contribuição para o PIS/PASEP

Quanto a essas incidências que tinham por base o faturamento – produto da integral da venda – e passam a ser calculadas sobre o ganho bruto, a redação da IN SRF nº 152/98 não deixa margens a dúvidas.

O mesmo não ocorre quanto ao imposto de renda e à contribuição sobre o lucro líquido. Referindo-se a esses dois gravames, na dicção do art. 2º, a autoridade administrativa usou as expressões “o valor a ser computado na determinação mensal das bases de cálculos” e, também, “pagos por estimativa”. Tais expressões se ajustam ao regime de apuração do lucro real anual com recolhimentos mensais por estimativa. Não se ajustam aos regimes de lucro presumido ou lucro arbitrado cujas apurações de base de cálculo ocorrem em períodos trimestrais.

Ademais o § 1º desse mesmo art. 2º da IN SRF nº 152/98 ainda afirma:

“§ 1º Na determinação das bases de cálculo de que trata este artigo será computada a diferença entre o valor pelo qual o veículo usado houver sido alienado, constante da nota fiscal de venda, e o seu custo de aquisição, constante da nota fiscal de entrada”

Ou seja somente as bases de cálculo indicadas no “caput” do artigo poderiam ser determinadas a partir da diferença entre o valor de venda e de compra do veículo usado.

Entendemos que o contribuinte inserido no regime de apuração do lucro real anual , para apurar em definitivo a base de cálculo da estimativa mensal, deverá aplicar o percentual de 8% (art. 15 da Lei nº 9.249/95) sobre o somatório das diferenças- preço de venda (-) preço de compra- havidas no período. Essa dedução é feita em contraste porque, senão, haveria a incidência da alíquota do imposto de renda e da contribuição social diretamente sobre o lucro bruto, ignorando-se então, as despesas operacionais; fato esse que provocaria recolhimentos em excesso, afrontando-se o princípio da capacidade contributiva.

Os contribuintes que optaram pelo regime do lucro presumido ou auto arbitramento haverão de beneficiar-se, pela redação da Instrução Normativa em causa, somente em relação às contribuições sociais incidentes até então sobre o faturamento.

Parece entender a administração que tais contribuintes já estariam em regime de tributação simplificada onde a base de cálculo é definida por presunção gerada a partir da receita bruta e não do lucro bruto.

Quanto ao imposto de renda e à contribuição social sobre o lucro dos contribuintes optantes pelo lucro real trimestral os contratos de compra e venda mesmo que não equiparados à consignação levarão ao mesmo resultado aritmético.

Acredito ser importante lembrar o leitor que nem a lei e nem o ato normativo induzem à conclusão de que os ganhos brutos apurados na compra e venda, nos casos aqui tratados, equiparar-se-iam a receita bruta para qualquer efeito.

Frise-se que desconhecemos, por ora, qualquer pronunciamento da administração quanto a esses pontos da matéria.

OS LANÇAMENTOS DE OFÍCIO

As normas em comento dão contornos e recepcionam os atos jurídicos praticados nos estritos limites estabelecidos. Quando preenchidos todos os requisitos ,sem exceção, estarão amparados tanto os contribuintes como a administração.

Exemplifiquemos com uma situação hipotética em que, o contribuinte emitiu todas as notas de entrada e de saída, elaborou o demonstrativo mensal mas errou na soma que determinaria a base de cálculo correta; nessa situação caberá ao fisco proceder aos lançamentos dos tributos e contribuições devidos com base na diferença de soma apurada.

Porém a situação não será a mesma se a fiscalização constatar omissão de receitas provada de forma direta ou através de presunções. Essas ocorrências obedecerão às regras próprias, inseridas no sistema jurídico, comum a todos os infratores.

- Publicado pela FISCOSoft em 31/08/1999

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

 

Juros Dissimulados em Contratos entre Pessoas Físicas – Análise das Disposições do Regulamento do Imposto de Renda – RIR/99


É surpreendente a inserção no Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto nº 3.000/99 – RIR/99 – de normas que não constavam de regulamentos anteriores e editadas há tanto tempo como é o caso do art. 850 que estabelece:

Subseção VI
Juros Dissimulados

Art. 850. O lançamento de ofício também será efetuado, no caso de pessoa física, em relação a juros, quando dissimulados no contrato que serão fixados pela autoridade lançadora, observadas a taxa usual e a natureza do título ou contrato (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 4º, § 1º).
Parágrafo único. O disposto neste artigo será aplicado sempre que, intimado a informar os juros de dívidas ou empréstimos, o credor deixar de fazê-lo ou declarar juros menores do que os percebidos (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 4º, § 2º).

A despeito de qualquer bom propósito do acontecido, procuramos aqui esboçar a melhor interpretação destes textos legais na forma que segue.

I – DO NÚCLEO DO FATO GERADOR DO IMPOSTO DE RENDA

1. Desde o fim do século passado os estudiosos vêm buscando uma perfeita delimitação e definição do conceito de renda utilizado pela legislação de vários países com fins tributários. Todos os conceitos produzidos na melhor doutrina, podem, para os fins aqui almejados, ser classificados em três escolas:

A – Escola da Fonte-Produto

B – Escola do Acréscimo Patrimonial

C – Escola legalista.

2. A Escola da Fonte-Produto também conhecida como Teoria do Fluxo entende o conceito de renda como sendo a mais valia gerada pela comparação das entradas e saídas de valor econômico passíveis de expressão monetária, num determinado período de tempo. Em outras palavras, o fluxo de entradas e saídas é fator determinante no conceito de renda.

3. A escola do Acréscimo Patrimonial entende que a renda é a mais valia apurada pela comparação do patrimônio ao final de um determinado período em relação ao patrimônio do início do mesmo período, reduzidas as parcelas referentes a meras transferências de renda tais como heranças e doações.

4. Escola legalista é aquela que acredita ser renda tudo aquilo que a lei estabelecer.

5. No Direito Tributário Brasileiro, podemos perceber facilmente que o conceito de fluxo embasa toda a tributação das pessoas físicas enquanto a tributação das pessoas jurídicas, também chamadas de pessoas empresariais, deriva da escola do acréscimo patrimonial. Diga-se de passagem que não é simples obra do acaso ,as pessoas jurídicas serem tributadas pelo conceito de acréscimo patrimonial e sim, uma conquista dos empresários face às peculiaridades da atividade empresarial em relação à força de trabalho das pessoas físicas. Para melhor compreensão podemos citar uma situação em que determinada empresa teve receitas em montante exatamente igual à somatória dos custos e despesas, o que implicaria no conceito de fluxo, em renda zero mas, no entanto, os bens patrimoniais sofreram a ação de desgaste provocado pelo tempo – depreciação – e o resultado foi negativo, ou seja, prejuízo comercial e fiscal.

II – A INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA E INTEGRADA

6. Nos estados democráticos, como entre nós, os princípios maiores da tributação, as normas gerais que a instrumentam e suas limitações são matérias reservadas à Constituição e às respectivas normas complementares. Nessa esfera de competência foi o campo de incidência do imposto de renda no Brasil definido como sendo a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica de renda- produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos- e de outros proventos de qualquer natureza que resultem em acréscimo patrimonial – Art. 43 do CTN com nível de lei complementar.

7. Por outro lado diz o princípio da estrita legalidade que não poderá haver incidência tributária sem prévia instituição legal do imposto. Entretanto não é suficiente a existência formal de uma norma de incidência tributária; antes de tudo, essa norma deverá ser plenamente integrada e harmônica com todo o sistema jurídico tributário para produzir todos os efeitos desejados. Lei que não se ajusta a todo o sistema jurídico é mero ato ineficaz.

8. A construção legal de um sistema, por outro lado, não é estanque, não ocorre em um só lapso de tempo, pelo contrário, vai evoluindo em razão das mudanças de comportamento e necessidades político-sociais. Então, não rara vezes, ocorre que o surgimento da norma B provoca o desaparecimento da norma A, seja por revogação expressa ou por derrogação sistêmica. Esse cuidado de análise deve o intérprete ter.

9. No caso em comento transparece essa dificuldade de interpretação. As matrizes legais do Art. 850 do RIR/99 foram editadas em 1.943, portanto há vinte e três anos antes da elaboração do Código Tributário Nacional e há quarenta e cinco anos antes da Constituição Federal de 1.988, atualmente em vigor. É então de se perguntar: Será que aqueles dispositivos legais de 1.943 estariam aptos a produzir efeitos em nosso atual sistema jurídico tributário ?

III – AS NORMAS SUBSTANTIVAS E AS NORMAS INSTRUMENTAIS OU ADJETIVAS

10. A questão temporal é importante mas não decisiva. O fato de não haver revogação expressa também nada justifica. O que importa mesmo é saber se tais dispositivos legais estão aptos a produzir os efeitos desejados. Acreditamos que o relevante na questão é a análise da natureza jurídica daqueles dispositivos legais. A conclusão não será a mesma se estivermos abordando normas substantivas – aquelas que efetivamente criam direitos e obrigações- ou normas instrumentais (adjetivas) que versam sobre matéria processual ou de prova.

11. Reconhecemos muita dificuldade em qualificar tais dispositivos como normas substanciais, eis que:

a) a incidência do tributo é sobre a renda e não sobre o patrimônio;

b) a base de cálculo do tributo pode ser presumida ou arbitrada mas não a efetiva auferição de renda ou proventos de qualquer natureza;

c) a renda não se cria antes se apura e se quantifica;

d) a materialização da renda em acréscimo patrimonial ou consumo há de ser provada não podendo ser deduzida por critérios econômicos da boa aplicação ou de oportunidade;

e) o contrato de empréstimo pode ser oneroso ou gratuito segundo os ditames do direito privado.

f) princípios constitucionais como os das garantias individuais, da típicidade , da vedação de efeitos confiscatórios, da capacidade contributiva e da legalidade para não falar de outros implícitos convergem em sentido contrário ao estabelecimento de uma renda legal a partir de um contrato particular;

g) a boa doutrina e a jurisprudência são firmes no sentido de que presunções – legais ou lógicas- dependem de provas, ainda que indiretas, da ocorrência do fato abstratamente tipificado como gerador de obrigação tributária.

12. Consideradas normas adjetivas ou processuais a eficácia de tais regras ainda dependerá de situações concretas perfeitamente amoldadas àquela prevista pelo legislador em 1.943. E, sem dúvida, tais situações serão de raríssima ocorrência; não estamos em 1.943.

13. Práticas ilícitas de pessoas físicas, nessa matéria, podem ter levado as autoridades tributárias a inserir tais dispositivos no novo Regulamento. Para as pessoas afetas aos assuntos técnicos do imposto de renda das pessoas físicas não é novidade a tentativa de burlar o fisco mediante o artifício de se registrar na declaração de rendimentos empréstimos passivos obtidos junto a outras pessoas físicas para acobertar variação patrimonial não justificada por, rendimentos tributáveis, isentos ou tributados exclusivamente na fonte. No entanto estes casos não se ajustam à hipótese do Art. 850 em comento. Aqui os contratos são simulados enquanto o recurso legal inserido no RIR/99 trata de contratos reais com os frutos dos mesmos ocultados.

14. Não podemos deixar de lembrar que se essas normas têm natureza instrumental e não substancial, outras da mesma natureza editadas após a vigência do atual Código Tributário Nacional concorrem no mesmo sentido e, obrigatoriamente, haverão de ser observadas durante o procedimento de ofício. Genericamente citamos todas as regras legais que versam sobre o Processo Administrativo Fiscal que primam pelo controle da legalidade do procedimento e da busca da verdade material; as presunções legais relativas só podem ser usadas se durante uma ação fiscal for impossível a apuração dos fatos concretos ou da renda real. Os princípios da razoabilidade e da materialidade presentes nas palavras do § 6º do art.6º da Lei 8.021/90 (ïn verbis: “Qualquer que seja a modalidade escolhida para o arbitramento será sempre levada a efeito aquela que mais favorecer o contribuinte.”) também não poderiam ser ignorados.

IV – A TÉCNICA DE INSERÇÃO NO REGULAMENTO DE 1.999

15. Na mesma subseção em que estão inseridos os dispositivos legais que cuidam das presunções legais vinculadas aos SINAIS EXTERIORES DE RIQUEZA e aos DEPÓSITOS BANCÁRIOS estão inseridos aqueles que tratam dos JUROS DISSIMULADOS POR PESSOAS FÍSICAS. Evidentemente não é obra do acaso. Respeitou-se sim a boa técnica da disposição sistematizada do código. O denominador comum entre tais mandamentos reside exatamente na natureza jurídica das normas visto que todas são normas processuais. Entretanto os sinais exteriores de riqueza e os depósitos bancários são fatos que quando apurados em atos de ofício justificam a incidência das presunções estabelecidas de forma legal visto que, são ocorrências materiais dos indícios de auferição de renda ,justificando então a repartição do ônus probatório. O mesmo não acontece com o contrato de empréstimo envolvendo pessoas físicas. Provada a existência do contrato bilateral restará ainda provar a existência da renda, ou seja, haverá o contrato de ser oneroso e não gratuito.

 

V – CONCLUSÃO

16. A par de todo o exposto, a própria semântica das disposições do Art. 850, caput, e respectivo parágrafo único nos leva a concluir que estamos diante de normas processuais e não substanciais. Em leitura cuidadosa e atenta percebemos que o legislador falou em lançamento de ofício – ação fiscal direta, juros dissimulados – frutos de um contrato oneroso – pessoa física – não se aplica à pessoa jurídica – e intimado a informar os juros, deixar de fazê-lo – hipótese autorizativa do uso do recurso legal – Todas essas características são típicas, em nosso sistema jurídico tributário, das presunções legais relativas.

17. Caberá então aos agentes da administração tributária a aplicação concreta dessas normas quando:

a) houver procedimento fiscal instaurado contra pessoas físicas;

b) for apurada a existência de um contrato de empréstimo de forma tácita ou explícita;

c) for provado, pelo fisco, ser o contrato de empréstimo oneroso;

d) intimado o contribuinte, este não prestar informações sobre os juros efetivamente auferidos ou prestar informações impugnáveis; e,

e) for detalhadamente caracterizada a ocultação total ou parcial da renda.

18. Percebe-se então que a inserção desses dispositivos legais no atual Regulamento do Imposto de Renda pouco contribuirá para solução de casos concretos eis que se efetivados os corretos passos processuais prescindir-se-á do recurso legal inserido no art.850 do RIR/99.

 

- Publicado pela FISCOSoft em 06/08/1999

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato