Subvenção governamental para custeio presente no parcelamento de débitos tributários federais

A natureza e a forma da subvenção

A conversão da Medida Provisória nº 449 de 2.008 resultou na Lei nº 11.941 de 2.009, também chamada de REFIS DA CRISE, a qual, entre outras modificações normativas, alterou, substancialmente, a legislação federal sobre o parcelamento ordinário de débitos tributários controlados pela Receita Federal do Brasil e pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, alcançando créditos tributários constituídos, não constituídos, inscritos ou não em Divida Pública da União. O novo diploma ainda permitiu um segundo parcelamento de saldos devedores de antigos processos já formalizados.

Para incentivar a adesão dos contribuintes devedores, o Poder Público concedeu reduções das penalidades e dos juros moratórios, escalonadas em razão do prazo do pagamento; maior a redução quanto menor for o prazo de pagamento escolhido.

No presente trabalho, nosso esforço estará direcionado a conhecer a natureza jurídica do que foi estatuído nos §§ 7º e 8º do art. 1º da Lei em foco que vem assim assentado:

“§ 7o As empresas que optarem pelo pagamento ou parcelamento dos débitos nos termos deste artigo poderão liquidar os valores correspondentes a multa, de mora ou de ofício, e a juros moratórios, inclusive as relativas a débitos inscritos em dívida ativa, com a utilização de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da contribuição social sobre o lucro líquido próprios.
§ 8o Na hipótese do § 7o deste artigo, o valor a ser utilizado será determinado mediante a aplicação sobre o montante do prejuízo fiscal e da base de cálculo negativa das alíquotas de 25% (vinte e cinco por cento) e 9% (nove por cento), respectivamente. “

A técnica jurídica da construção pode ser extraída do núcleo do texto legal, na inflexão do verbo poder – (…) poderão liquidar – revelando uma espécie de AUTORIZAÇÃO do ESTADO CREDOR direcionada ao CONTRIBUINTE DEVEDOR, presente no pólo passivo de uma relação processual. O contribuinte está autorizado a saldar parte de seu débito valendo-se de um valor apurado em sua escrituração fiscal- valores controlados no LALUR-.

A extinção de uma obrigação se faz com moeda corrente ou ativo equivalente. Existem outras formas de pagamento, como sabemos; a dação em pagamento, por exemplo. O que importa, na extinção de uma obrigação é que o credor satisfaça seu crédito mediante agregação, ao seu universo patrimonial, de riqueza transferida pelo do devedor, que sofre redução patrimonial equivalente. Portanto há um pressuposto fundamental na aplicação desta AUTORIZAÇÃO; o CONTRIBUINTE DEVEDOR deve ser titular de um direito patrimonial a ser transferido ao ESTADO CREDOR.

Não se conformam aos limites jurídicos de um direito patrimonial constituído, os valores referentes aos prejuízos fiscais acumulados e às bases de cálculo negativas da CSLL, controlados no Livro de Apuração do Lucro Real – LALUR PARTE B-. Estes valores consubstanciam-se em expectativas de direito porque seus proveitos econômicos dependem de eventos futuros e incertos. Portanto tais valores em si não são direitos patrimoniais constituídos que possam ser aproveitados para extinção de passivos tributários. È a Lei em comento que encerra a própria geração destes direitos patrimoniais. Cuida-se de uma geração de direitos do particular, por ficção jurídica, cujo conteúdo econômico se manifesta pela redução de parte do crédito constituído do Poder Público. Daí surge o caráter subvencional da autorização.

Esta subvenção não se destina à expansão de empreendimento econômico ou a investimento e, não pode ser confundida com doação, porque o contribuinte deverá abrir mão de futuros direitos. Portanto, se afasta, por completo, o que consta do art. 195-A da Lei 6.404/76 – Reserva de Incentivos Fiscais no Patrimônio Líquido-.

Sem afronta ao princípio da isonomia, a subvenção destina-se aos contribuintes devedores que aderiram à proposta de parcelamento de seus débitos. Caracteriza-se assim a figura da subvenção de custeio.

Contabilização

Não há duvida de que estamos frente a um caso exemplar de subvenção governamental não monetária. A subvenção se traduz num ativo não monetário- crédito fiscal- que será usado para quitar parte do passivo fiscal da entidade empresarial (redução de passivo).

Instaurado o processo de parcelamento deve o valor relativo à subvenção ser registrado em conta especifica do Ativo Circulante, restando saber qual será a contrapartida deste registro comercial.

Tendo em vista as disposições da Lei nº 11.638/2007 que outorgou poderes ao Comitê de Pronunciamentos Contábeis para disciplinar a legislação contábil brasileira, recorremos ao disposto no CPC- 07 de onde extraímos fragmentos do Sumário de tal ato regulamentar que assim estabelece:

“Atenção especial é dada neste Pronunciamento ao momento do reconhecimento das subvenções governamentais. E a essência econômica da transação deverá ser sempre observada. As subvenções, mesmo as não monetárias, não devem ser reconhecidas até que exista segurança de que a entidade cumprirá todas as condições relacionadas à obtenção da subvenção e de que será efetivamente recebida. O simples recebimento de uma subvenção não é prova conclusiva de que as condições associadas à subvenção tenham sido ou serão cumpridas. E a forma como uma subvenção é recebida não influencia no método de contabilização a ser adotado. Assim, o reconhecimento da receita de subvenção governamental no momento de seu recebimento somente é admitido nos casos em que já cumpridas as condições necessárias à sua efetivação e em que não há bases de alocação da subvenção ao longo dos períodos beneficiados. Enquanto não atendidos os requisitos para reconhecimento no resultado, as contrapartidas das subvenções governamentais registradas no ativo serão em conta específica do passivo. No caso de subvenção na forma de ativo não monetário, a contrapartida poderá ser uma conta retificadora desse ativo.”

Do texto podemos inferir, de pronto, que a essência econômica prevalece sobre a forma jurídica. Portanto somente quando a entidade efetivamente auferir de forma definitiva os benefícios econômicos, haverá o reconhecimento da subvenção como receita da entidade, em conta de resultado. Enquanto isto não acontecer a entidade terá opção de abrir uma conta especifica no passivo ou abrir uma conta retificadora do ativo com saldo credor.

A rigorosa observância deste Pronunciamento se impõe pelo fato de a RFB e a PGFN terem poderes normativos na matéria- §3º do art. 1º da Lei nº 11.941 -. No âmbito destas atribuições, podem elas, em ato de revisão do procedimento, alterar, de ofício, os valores informados pelos contribuintes (art. 27 da Portaria Conjunta nº 06 de 2.009), reduzindo, assim, o valor efetivo da subvenção.

Temos fortes motivos para acreditar que tais reduções de ofício acontecerão em larga escala. A razão desta crença está no fato de que os valores controlados, pela RFB, no SISTEMA DE ACOMPANHAMENTO DO PREJUÍZO FISCAL E DO LUCRO INFLACIONÁRIO (SAPLI) não coincidem com os valores constantes da escrita fiscal dos contribuintes. As divergências surgem quando a entidade empresarial sofre um Auto de Infração que resulta em Redução de Prejuízo Fiscal e de Base de Cálculo Negativa da CSLL; impugnado o lançamento de ofício a entidade não promove as reduções apontadas nos Autos de Infração, enquanto, na repartição pública, o SAPLI é sensibilizado pelo agente tributário. Assim o mesmo fato jurídico passa a ser representado por dois valores até a solução final do processo administrativo ou judicial.

Subvenção isenta de tributação

A condição, imposta na Lei, de aprovação pelas autoridades tributárias não impede, entretanto, as ocorrências dos fatos geradores do IRPJ, da CSLL, do PIS e da COFINS no momento da formalização do pedido de parcelamento. A formalização do Pedido de Parcelamento revela uma situação jurídica de ocorrência de ato firmado sob condição resolutória por que a Lei estabeleceu a renuncia fiscal de forma objetiva – preenchidas as condições iniciais, o contribuinte ingressa no gozo do benefício sendo os pagamentos parciais o implemento da condição resolutória-.

A geração ficta de um crédito tributário também não se confunde com a formação de uma Provisão Ativa que é registrada no Ativo Circulante tendo por contrapartida conta de resultado com lançamento a crédito. Em verdade a subvenção materializa um ganho refletido pela redução do passivo tributário da entidade.

Isto posto temos que os contribuintes estariam obrigados a tributar o valor da subvenção no momento da formalização do Pedido de Parcelamento, caso não houvessem as isenções expressas na própria norma que concedeu a subvenção – Lei nº 11.941/2009-, verbis:

Art. 4º ((…)) . Parágrafo único. Não será computada na apuração da base de cálculo do Imposto de Renda, da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, da Contribuição para o PIS/PASEP e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – COFINS a parcela equivalente à redução do valor das multas, juros e encargo legal em decorrência do disposto nos arts. 1º, 2º e 3º desta Lei.

Destaca-se que as expressas citações de isenção confirmam a natureza da subvenção de custeio e seu atributo jurídico de ganho. Não fosse o caso, o legislador ordinário não seria compelido a se manifestar por escrito.

De outro lado, as diferenças de tratamento contábil e tributário não podem confundir o leitor. Para efeitos tributários há ocorrência de um ganho isento, enquanto que na disciplina contábil há registro especial de um ativo não monetário com origem em receita, a ser reconhecida de pronto ou no futuro.

Influenciarão no reconhecimento contábil da receita os valores envolvidos e o prazo revisional afeto às autoridades. A receita será reconhecida quando ficar afastada qualquer possibilidade de restabelecimento da dívida, o que poderá acontecer somente ao final do parcelamento.

Antecipação espontânea da receita contábil

È de se registrar ainda que o fato de a receita desta subvenção estar isenta das quatro exações citadas, não significa que haverá tolerância das autoridades tributárias quanto à antecipação espontânea do ganho. Não podemos deixar de advertir que antecipação contábil do ganho implica majoração dos saldos do Patrimônio Líquido e dos limites de cálculo dos JSCP do exercício seguinte.
- Publicado pela FISCOSoft em 21/09/2009

 

RENZO & SEWAYBRICK ASSESSORIA E CONSULTORIA TRIBUTÁRIA LTDA

Dr. Jeferson Roberto Nonato

 

 

 

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